O que há por trás do crescimento vertiginoso dos microapartamentos na capital paulista? O Ministério Público investiga a concessão, pela Prefeitura de São Paulo, de subsídios fiscais usados pelo mercado imobiliário para a construção de quase 240 mil apartamentos que deveriam ser destinados a famílias de baixa renda. Esses empreendimentos, que deveriam ser habitações de interesse social, se transformaram, na prática, em um negócio lucrativo: estúdios de 25 a 40 metros quadrados, vendidos para investidores que alugam a preços altos.
No episódio dessa semana do podcast UOL Prime, apresentado por José Roberto de Toledo, Adriana Ferraz explica como a falta de fiscalização rigorosa abriu espaço para fraudes na aquisição desses imóveis, tema da reportagem "Famílias de classe média estão comprando imóveis para baixa renda sem saber". O inquérito tem como foco os chamados "studios", unidades habitacionais muito pequenas que atraem solteiros e casais sem filhos, mas que, pela lei, deveriam ser destinados a famílias de baixa renda. Desde o Plano Diretor de 2014, há incentivo por parte da prefeitura de São Paulo para a construção dessas moradias.
O poder público abre mão de taxas para incentivar a iniciativa privada a construí-las com a intenção de aproximar essas famílias de locais dotados de infraestrutura urbana. "É difícil imaginar que uma família possa viver em um espaço tão reduzido, especialmente pagando um valor que, por metro quadrado, se equipara ao de imóveis de luxo. No fim, são apartamentos feitos para solteiros, mas incentivados como habitação social", critica Adriana. A regra municipal define que apenas famílias com renda mensal entre três e seis salários mínimos (R$ 4.236 a R$ 8.472) poderiam comprar ou alugar esses imóveis.
Porém, concentrados em bairros nobres como Itaim Bibi e Pinheiros, esses projetos se tornam inacessíveis a essa faixa de renda — o metro quadrado destas unidades chega a custar R$ 19 mil. Além de não cumprirem a finalidade original do Plano Diretor, esses empreendimentos enfrentam outro grande problema: a falta de transparência na venda das unidades.
Conforme o UOL apurou, muitos proprietários fecharam negócio com as construtoras sem saber que estavam adquirindo um imóvel destinado a habitação social e que, portanto, precisariam cumprir restrições de renda. "Muitas vezes, os compradores nem sabem que estão adquirindo uma moradia social, pois as construtoras não fazem questão de comunicar isso. No panfleto promocional, não há nada grande e claro mencionando que se trata de um empreendimento de interesse social", aponta Adriana.
Afonso Pola (afonsopola@uol.com.br) é sociólogo e professor.