O estado de São Paulo é o único brasileiro que realiza o transplante de intestino e multivisceral, que transplanta blocos de órgãos digestivos. Na capital paulista, são dois hospitais que realizam o procedimento em adultos: o Hospital das Clínicas, ligado à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, e o Hospital Israelita Albert Einstein.
Esse tipo de transplante é indicado para pacientes que, por algum motivo, perderam o intestino ou o órgão não funciona adequadamente, impedindo que o paciente consiga se nutrir. Esse quadro é chamado de síndrome do intestino curto e suas principais causas são ressecções intestinais extensas, doença de Crohn, trombose mesentérica, trauma e alguns tumores.
O cirurgião do HC, Rubens Macedo Arantes Júnior, explica que são pessoas que não conseguem mais se alimentar por via oral e recebem os alimentos apenas pela veia. O especialista explica que o procedimento cirúrgico é complexo porque normalmente são pacientes que têm múltiplas cirurgias anteriores. O procedimento para o transplante é longo, podendo durar até 12 horas.
Modalidades do transplante de intestino
São quatro modalidades principais da cirurgia: o intestino isolado, sendo realizado o transplante apenas do intestino delgado; o transplante do intestino associado ao fígado; o multivisceral modificado, em que se transplanta em conjunto o estômago, duodeno, pâncreas e intestino delgado; e, por fim, a quarta modalidade que é o transplante multivisceral, que consiste no transplante em bloco do estômago, duodeno, pâncreas, intestino e fígado.
Aos 20 anos, Lucas Amorim teve complicações durante uma cirurgia e perdeu o intestino delgado. O ano era 2012 e a equipe que o tratava no Piauí entrou em contato com o Hospital das Clínicas de São Paulo para que o jovem pudesse fazer um transplante de intestino.
Lucas veio para São Paulo, mas a espera pelo novo órgão demorou quase oito anos. A demora foi em decorrência da dificuldade de encontrar um doador compatível. Durante todo esse período, Lucas só conseguiu se alimentar via cateter e com sérias restrições.
Em fevereiro de 2020, ele conseguiu fazer o transplante do intestino delgado, mas o processo de recuperação foi complicado. Por um ano, teve episódios de rejeição do órgão. A alta médica hospitalar veio em junho de 2021, quando pode, finalmente, voltar para sua cidade natal, Teresina.
“Hoje, já posso estudar, trabalhar, praticar atividades físicas, dar seguimento para a vida. Durante oito anos, eu fiquei assistindo a vida passar”, conta. “Eu brinco que tenho dois aniversários, um é na data do meu nascimento, o outro é quando eu recebi o transplante.”
O cirurgião do HC Rubens Macedo Arantes Júnior explica que fora a complexidade do transplante, há também a preocupação com o pós-cirúrgico: “O intestino é um órgão que tem complexidade imunológica muito grande. Problemas como rejeição e infecções são muito frequentes, por isso o manejo desse paciente no pós-operatório é bastante complexo.”
No entanto, o médico ressalta a importância deste tipo de transplante: “Pacientes que perderam o intestino e que não conseguem mais se alimentar pelo sistema digestivo têm essa possibilidade de tratamento. A divulgação é importante ainda para que essas pessoas não fiquem sofrendo com a condição clínica tão difícil.”
Lucas Amorim, hoje com 32 anos, conta que tem uma vida completamente nova. “A doação é uma forma daquele ente querido que você perdeu continuar vivendo em outra pessoa.”