Em 15/02/2005, Severino Cavalcanti (PP-PE), um deputado do baixo clero, era eleito presidente da Câmara dos Deputados, com 300 votos. Ele construiu sua candidatura com a promessa de elevar salários e de melhorar as condições de atuação dos colegas congressistas, derrotando o candidato do governo, o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP).
Ainda naquele ano, Severino se viu obrigado a renunciar ao cargo e ao mandato parlamentar, para evitar um processo por quebra de decoro, que poderia levar à cassação e à perda de direitos políticos, acusado que foi de cobrar propina mensal de um empresário para a operação de um restaurante na Câmara. Pensava eu, naquele momento, que a falta de compostura de um parlamentar havia atingido seu limite, que o fundo do poço estava no Severino. Ele foi, até aquele momento, uma vergonha absoluta.
Dez anos depois, a presidência da Câmara voltou a chamar muito atenção, quando o eleito foi o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Carregando consigo uma série de suspeitas de atos de corrupção, Cunha mostrou que Severino não foi o pior mal na presidência da Câmara.
Eduardo Cunha foi afastado da presidência em 5 de maio de 2016 por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que também suspendeu o seu mandato. Em 7 de julho ele renunciou à presidência da Câmara. Sua atuação na presidência da Casa foi marcada pelo seu envolvimento em casos de corrupção, além de ter usado seu poder político para promover o impeachment de Dilma Rousseff. Em outubro do mesmo ano ele foi preso em Brasília condenado por improbidade administrativa.
Mais uma vez, tive a impressão de que tínhamos atingido o fundo do poço. Outro engano, pois aí veio o Arthur Lira (PP-AL). Assim como o Eduardo Cunha se movia para criar dificuldades ao governo Dilma, Arthur Lira se movia criando dificuldades ao governo Lula. Nunca as comissões parlamentares tiveram composições tão esdrúxulas, dirigidas por expoentes da extrema direita. Nunca as bancadas evangélica, da bala, do agro tiveram tanto respaldo da presidência da Casa como na sua gestão. Seu legado foi o famigerado e criminoso orçamento secreto.
Fundo do poço? Não. Porque veio o Hugo Motta. Político medíocre, sua característica maior tem sido desagradar a todos. Tem colocado a sua condição de presidente da Câmara a serviço de parlamentares condenados e que estão foragidos. Os mantém na condição que não mais deveriam ter. Para os parlamentares da extrema direita que tomaram sua cadeira de presidente, nenhuma punição, para o deputado Glauber a truculência da polícia legislativa, com agressão inclusive a jornalistas.
Ou seja, parece que esse raio de poço não tem mesmo fundo.
Afonso Pola (afonsopola@uol.com.br) é sociólogo e professor