Durante seis anos de minha vida adolescente, o título desse texto foi o meu companheiro. Para o meu pai tinha outro nome: Boca Rica. Foi um de seus investimentos em minha carreira de sorriso fácil.
Minha arcada dentária era completamente invertida, então, o único jeito era me adequar aos ferrinhos que antigamente não eram fashion como os de hoje e motivo de muitas troladas na escola. Quem já usou sabe o quanto isso é incômodo.
Ia semanalmente ao meu dentista, que ficava em Poá, para apertar os benditos. Saía de lá com todos os dentinhos sensíveis sabendo que nos próximos dois dias precisaria chupar o pão nosso de cada dia literalmente. Também levar o dobro ou até o triplo do tempo nas escovações, já que aquilo é um acúmulo em exponencial de todo resto de coisas que comemos.
Você acaba adquirindo um tique macabro de passar sua língua sobre ele e de tanto fazer isso, se satisfazer com o sangue que começa a minar com a coitada toda ferida. Para ajudar, ainda usava uns elásticos transversais entre as arcadas. Sim, era meio nojento. E eles adoravam estourar no meio da aula, naquele silêncio sacro onde meu pior professor estava explicando uma matéria chatíssima e eu, com o susto, soltava uma palavra impublicável.
Quando achava que nada mais podia acontecer, em um das consultas ganhei uma espécie de coleira. Deveria usar aquilo por no mínimo quatro horas seguidas, ou seja, em algum momento a turma toda da escola me veria e novas troladas surgiriam até que ele me fala que se eu aprendesse a dormir com aquele ferro para fora da boca, o resultado seria muito melhor e me livraria das risadas cruéis da galera.
Ah, não tive dúvida e naquela mesma noite dormi com o bendito enfeite. Dormi na verdade não, mas aos poucos fui me acostumando com ele. No final de tudo isso, pelo menos, o objetivo foi alcançado e no meu aniversário de 17 anos, ganhei o presente de estar com o sorrisinho recauchutado, sem meus companheiros brilhantes.
Agora é esperar a dentadura, pois, sabe como é, né? Os 17 já faz um bom tempinho que se foram.