Ao completar 462 anos, Mogi das Cruzes chega no início do século XXI mantendo um amplo legado cultural e ambiental, mas com necessidade de abordar questões importantes acerca da desigualdade econômica e da participação popular. Esta é a visão do doutor em História e professor titular da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), Mário Sérgio de Moraes, em entrevista concedida ao Grupo MogiNews/DAT.

O professor, além de lecionar no curso de História da UMC e na Faculdade Armando Álvares Penteado (Faap), é autor de obras que abordam a história e a cultura da cidade e da região. Entre os seus trabalhos estão os livros "Nova História de Mogi das Cruzes" e "Aventuras do Diogo", ambos pela Editora Mogi News, além de "Estação Memória" e "50 Anos Construindo a Democracia".

Moraes falou sobre o avanço populacional do município a partir da primeira metade do século XX, quando a população de Mogi saltou de 30 mil habitantes em 1940 para uma estimativa de meio milhão em 2022,  mas mantendo aproximadamente a mesma ocupação do território. Tal aumento populacional acabou gerando, na visão do historiador, problemas de ordem social.

"De um lado você tem uma modernidade, uma cidade com um aparato razoável de bem-estar nas áreas de Saúde e Educação na comparação com outras cidades, mas a desigualdade também aumentou desde o final da Segunda Guerra Mundial, com aproximadamente um décimo da população em plenas condições de vida e 60% vivendo com renda de até dois salários mínimos. Há um abismo entre classes sociais, onde um lado não conhece o dia-a-dia do outro", apontou.

A desigualdade em Mogi é, na visão de Moraes, um padrão nacional aplicado às decisões da economia e do desenvolvimento em linhas gerais, com as classes sociais mais altas investindo no reforço da segurança, educação e saúde, enquanto que a maioria da população depende dos serviços públicos que estariam defasados. "Percebemos dentro da sociedade desníveis sociais, onde o padrão de vida da Vila Oliveira é completamente diferente do que se vê nos bairros mais periféricos, no acesso à cultura, ao esporte, ao lazer, onde há famílias completamente desassistidas", explicou.

 

Eleições e patrimônios

Na política, em ano eleitoral, Mário Sérgio ressaltou a exaustão do que chamou de "antigo discurso" de grupos políticos tradicionais. O historiador ressaltou que a busca da narrativa de uma cidade sem problemas, em contraste com a realidade da população, fez com que em 2020 uma candidatura tida como fora do sistema - do ex-vereador Caio Cunha (Pode) fosse escolhida. "A sociedade, de certa forma, quis algo absolutamente diferente, por esse tipo de informação por vezes publicitária que vem ocorrendo desde a Proclamação da República, em uma relação hierárquica, de obediência", exemplificou.

Sobre os patrimônios da cidade, Mário Sérgio apontou diversos pontos criados de forma orgânica e popular, como o modelo de desenvolvimento agrário do município baseado na policultura, no minifúndio, na agricultura familiar e no atendimento ao mercado interno, com base nas contribuições da imigração japonesa à região, também culturalmente para a identidade da cidade. "Temos que resgatar a cultura e nossa história para que as pessoas saibam a direção correta para onde devemos ir", disse.

O professor e autor também reforçou o patrimônio cultural sertanejo no Varejão, local que é apresentado para amigos que estão de passagem pela cidade, e eventos como a Festa do Divino. Em sua visão, em ambos os locais o contato amplo e sincero entre a população permite a troca de experiências, de histórias e de um patrimônio imaterial que não deixa a desejar comparado com outros locais.