O Café com Mogi News desta terça-feira (3) entrevista Bianca Ortiz, diretora do Instituto Lá Campos, com ações em Mogi das Cruzes e região. Desde a ideia inicial, ainda na Faculdade de Gestão Empresarial, foram 10 anos até que se consolidasse a parceria com Rodrigo Fernandes, presidente da instituição. 

Além do trabalho com jovens instituição com jovens que estão saindo para o mercado de trabalho, a equipe do instituto tem trabalhado a Economia Criativa, que, segundo a entrevistada, é o que gera renda a partir da criatividade humana, sendo inerente ao ser humano, incluindo áreas como gastronomia e música. Atualmente está em andamento um mapeamento do segmento em Mogi das Cruzes, que deve ser expandido para outras cidades do Alto Tietê. "O criativo está em qualquer lugar. A gente precisa, na nossa profissão, seja ela qual for, ser criativo, porque a criatividade é a resolução de problemas", destaca.

O nome Léa Campos, segundo Bianca, homenageia uma senhora carioca e seu legado na Assistência Social. Para os jovens, é oferecida jornada com mais de 330 cursos EAD (educação a distância), com objetivo de apresentar oportunidades e novos caminhos.  Saiba mais nesta entrevista, produzida com apoio da Padaria Tita. 


Café com Mogi News: Como você começou no terceiro setor? Qual é a sua formação?
Bianca Ortiz:
Eu sou gestora empresarial e foi na faculdade de Gestão Empresarial que nasceu a ideia, mas eu demorei 10 anos até contar a ideia para o Rodrigo (Fernandes), que é o presidente do Instituto, e a gente fez uma parceria para iniciar. Foram 10 anos dormindo na gaveta e tem cinco anos que está na rua, fazendo acontecer.


CMN: O nome Léa Campos é uma homenagem?
Bianca:
Era uma senhora carioca que fazia assistência social na época dela, do jeitinho dela, e o Rodrigo que sugeriu essa homenagem. Eu não a conheci em vida, mas eu conheço todo o legado dela, os filhos. Foi tranquilo  homenagear uma pessoa com um legado tão bom.


CMN: Quais são as ações que vocês realizam, como é o funcionamento do Instituto?
Bianca:
O Instituto começou com crianças e jovens em educação social, desde aquele mínimo “por favor”, “obrigada”, até conteúdos profissionalizantes. Hoje a gente deixou um pouquinho em stand by com crianças. Temos ótimas organizações aqui em Mogi que cuidam das crianças, e a gente passou a atender aquele jovem que está saindo para o mercado de trabalho e ainda não sabe direito o que quer da vida. A gente tem uma jornada com mais de 330 cursos EAD (educação a distância pela plataforma Múltipla EAD), para que ele descubra o que gosta, e quando for descobrindo, que tenha o diploma disso. Ele já entra no mercado de trabalho mais tranquilo. 

CMN: Tem alguma atividade que é mais procurada por esses jovens?
Bianca:
Não, porque é justamente o acesso à plataforma toda que é o grande x. São 18 áreas de conhecimento, então o jovem muitas vezes não tem referência e outros não sabem em quais áreas um médico pode trabalhar, um jornalista ou alguém de TI (Tecnologia da Informação). É nisso que a gente auxilia com esses cursos, para abrir a mente para outras áreas.


CMN: Como vocês identificaram esse trabalho para chegar no jovem?
Bianca:
Resolvemos focar nesse nicho que está um pouquinho abandonado. Na verdade, o Instituto nasceu para a educação dos jovens. Somos pequenos ainda, então a gente não consegue atender todo mundo de uma vez, por isso o foco é nos jovens e na entrada no mercado de trabalho.


CMN: Vocês têm retorno desse jovem depois que faz o curso, quando consegue uma oportunidade?
Bianca:
No mercado esse jovem continua sendo da organização que a gente está, mas sempre o resultado é muito bom, porque é difícil você falar assim: 'toma, faz aqui'. Você direciona primeiro e fala: 'entra aqui, faz assim desse jeito', e depois o jovem consegue identificar alguma coisa que ele realmente goste, e essa é a cereja do bolo para a gente. Nós temos o retorno não exatamente do jovem, mas de quem está dirigindo a organização.


CMN: Quais são os outros projetos vocês desenvolvem?
Bianca:
A gente faz um trabalho muito grande agora com a Economia Criativa. Sempre fizemos as capitações do Instituto e as ações desde o nosso nascimento com a Economia Criativa.


CMN: Como a gente pode definir a Economia Criativa?
Bianca:
A economia criativa é o que gera renda, só que a partir da criatividade humana, ela é inerente ao ser humano. 'Mas e a Inteligência Artificial?', ela pode ser uma inovação, que é uma área da Economia Criativa, da criatividade, mas não está atrelada, ela tem que ser humana. Um exemplo muito simples são os festivais. Sabe quando a gente vai para um lugar que tem food truck, música no palco, brinquedos? Isso é um evento de Economia Criativa. Porque você alia a gastronomia, a música... Coisas que a gente não sabe, mas a gastronomia é uma área da Economia Criativa. É muito abrangente, mas o que ela gera é muito grande para o Brasil. 2,64% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro é da indústria automobilística, que é uma coisa que a gente já tem muito mapeado, já conhecemos. A Economia Criativa é 3,11% do PIB. É maior e tem todo o potencial de crescimento.

CMN: A gente não tem essa dimensão.
Bianca:
Não tem, primeiro porque a gente não sabe o que é, então hoje o nosso trabalho é fazer essa educação, pelo menos a sensibilização das pessoas para o que é Economia Criativa. Muita gente já faz, e aqui a gente já tem um exemplo super lindo e rico de Economia Criativa, porque é cultura do brasileiro sentar e tomar um café, por isso temos o programa de vocês (Café com Mogi News) assim tão bem feito. A gente senta um pouquinho, conversa, sempre tem uma reunião em um café, tem as padarias, então isso é um setor que ninguém imagina, que fala 'é comércio', mas é um empreendimento criativo. 


CMN: Vocês começaram agora um plano, voltado para isso?
Bianca:
A gente não tem dados, o que a gente não tem mapeado não consegue fomentar e entender, por isso a gente focou na Economia Criativa, porque a gente enxerga como desenvolvimento social. O mapeamento vem para trazer dados para a cidade de Mogi e depois para as outras cidades do Alto Tietê, mas para que a gente entenda o que já tem aqui e o que podemos aumentar, gerar renda com essa parte da economia, que é tão subaproveitada. 


CMN: Como você vê de potencial para essa economia, em gerar mais renda, inserir pessoas no mercado de trabalho?
Bianca:
Eu tenho feito palestras com jovens, e o que a gente vê é que primeiro eles não sabem que dá para fazer algo que eles gostam como renda, como atividade. Isso já é o primeiro passo, assim, às vezes é um hobby, uma renda extra e pode virar um negócio. O criativo está em qualquer lugar. A gente precisa, na nossa profissão, seja ela qual for, ser criativo, porque a criatividade é a resolução de problemas. Para resolver os problemas, a gente precisa se virar. Quando a gente sai do ponto A e vai para o B, com uma solução diferente, é o que faz hoje os profissionais se destacarem, são pequenas coisinhas que falando a gente vai agregando mais gente para a Economia Criativa. O mapeamento é para entender o que já existe, quais áreas já estão mais desenvolvidas dentro da Economia Criativa. Então, temos filmes, games, para entender a cultura em geral.


CMN: Já tem algum direcionamento de algum setor?
Bianca:
Todo mundo pergunta isso e não tem como chutar, porque a gente vai fazer por distrito e cada um vai ter a sua peculiaridade. Nesse levantamento a gente quer que Mogi se direcione para entrar na rede de Cidades Criativas da Unesco. É daqui dois anos o próximo edital e até lá a gente vai entender, das sete que a Unesco desenvolve, em quais estaremos mais aptos a entrar. Se é música, cinema, artes midiáticas, gastronomia.
Nós temos 12 Cidades Criativas no Brasil e são mais de 300 pelo mundo. Santos que é uma cidade próxima da gente, é por ser locação de cinema. Hoje, com o título de Cidade Criativa, a cada 15 dias eles têm um festival criativo feito pelo poder público. 


CMN: Na verdade, você vai iniciar um processo, que pode trazer mais recursos e novidades para a cidade.
Bianca:
É um título com o qual você vai estar inserido no mundo. Como o terceiro setor, ele está muito inserido, porque fazer um festival, igual a gente tem aqui em Mogi, quando as organizações estão inseridas na gastronomia, isso tudo é Economia Criativa, e lá em Santos eles fazem também, então gera renda para todo mundo.


CMN: Como você vê esse vínculo com o terceiro setor? A gente vê os negócios de impacto social crescendo. Como você vê esse segmento?
Bianca:
O terceiro setor foi, por muito tempo, mal visto por más práticas, que todo mundo que está no terceiro setor hoje tenta desmistificar, tenta melhorar a imagem do segmento. Aquela coisa de 'foi criada uma ONG para entrar algum dinheiro', 'será que aquele dinheiro que entra é empregado realmente?', por isso que a gente mostra o impacto social, qual é o impacto que a sua organização está colocando na cidade, na comunidade. Mas hoje eu vejo que o poder público não dá conta de fazer tudo, ele não consegue chegar na ponta, então quando ele está junto com o terceiro setor, aí sim o dinheiro sai de um lugar e vai para o outro. Você sabe que vai ser bem colocado, porque vai chegar nas crianças, nos idosos, nas mulheres, cada um vai ter. As categorias de classe que hoje a gente vê, muitos se unindo para fazer coisas legais para os seus nichos profissionais. Eu sou apaixonada de verdade pelo terceiro setor e eu acho que evoluiu muito.

A gente nasceu do assistencialismo, das senhoras. A gente tem esse passado em que tirava dos ricos e dava para os pobres, e é todo um processo de gestão que hoje a gente tem que mostrar. Temos um Marco Regulatório que tem que seguir. Desde 2014, são nove anos que já tem um Marco e todo mundo teve que se adaptar ou não. No caso do Instituto, a gente já nasceu com o marco, então nosso Estatuto já é todo feito dentro do Marco Regulatório, mas muita gente teve que mudar, então a gente tem que estar aberto a mudanças no terceiro setor e melhoria contínua, porque os públicos mudam, o jeito de captar, de conversar com seu público, de passar isso para a sociedade.

CMN: Nesses cinco anos você já sempre essa mudança?
Bianca:
Nossa, eu falo que a gente pivota, bate em uma parede e dá meia volta, porque você não pode ter compromisso com o erro. Não é que você fez com aquele intuito de errar, mas às vezes não dá certo, só que você vai ficar insistindo em algo que não está dando certo? Você prefere ficar ali sendo que você pode conseguir fazer algo diferente inovando com criatividade, com ações que mostrem melhor o que você está fazendo? É por isso que eu acredito no terceiro setor, que é algo em evolução, ficar muito rápido para a gente ir se adaptando.


CMN: A equipe é muito grande?
Bianca:
A gente fala que é mão na massa. Toda a parte administrativa é nossa, mas a gente tem o conselho consultivo, a diretoria, todo mundo voluntário. Nós temos a embaixadora, a Renata e a Patrícia que são a equipe técnica, psicóloga e assistente social, e fora outros que vão sempre na parceria, que acabam sendo voluntários. É muito gostoso que eles entendem o porquê das coisas, do porquê a gente está chamando para ser parceiro.
O conselho consultivo saiu dessa galera. Os artistas também, porque nós temos os parceiros que a gente sempre cutuca e fala: 'vamos fazer isso com a gente?'.


CMN: Como você vê o futuro do Instituto? Vocês estão com esse plano da Economia Criativa, tem outras ações e planejamento?
Bianca:
O foco hoje é o desenvolvimento social pela Economia Criativa, então a gente lançou em agosto o mapeamento de Mogi das Cruzes, ele é o terceiro do Brasil. A gente teve um no Vale do Ribeira e está tendo um no Vale do Paraíba, feitos pelo Garimpo de Soluções, que é da Ana Carla Fonseca. O nosso aqui em Mogi falam que é meio o IBGE da Economia Criativa, é o Censo para identificar. Nós queremos ir para as outras cidades do Alto Tietê, e acabou que antes fomos para Soledade de Minas (MG), uma cidade bem pequenina, mas que fica perto de São Lourenço, então tem um potencial turístico, criativo e econômico muito forte. Foi lá que a gente começou a desenvolver algumas ações. Nós queremos espalhar para o Brasil o que estamos fazendo. Não somos muitos especialistas em Economia Criativa no Brasil, mas eu vejo que os que existem estão empenhados em fazer isso acontecer.


CMN: Tem um prazo para a conclusão desse Censo?
Bianca:
Sim, é março de 2024, porque em abril nós vamos fazer o primeiro festival de Economia Criativa de Mogi, já está marcado. A gente vai fazer um documentário ou um livro, só que nós demos um prazinho maior, porque vai ser mapear 11 distritos. A localidade é que faz a identidade. Pode ser que lá em Quatinga a gente tenha o turismo rural, e a gente foque mais nisso, algum artesanato ou gastronomia, que é a gastronomia dos pesqueiros. Aqui para o centro a gente já tem outra coisa.


CMN: Parte do patrimônio também?
Bianca:
Entra pela parte do turismo, o patrimônio em si não é a nossa, apesar da gente amar uma história. O patrimônio é algo que a gente levanta muito a bandeira, de não ter o passado apagado, de conhecer o que a gente tem. Se você for pensar até um aplicativo que a gente faz aqui em Mogi, próprio para a cidade ou que nasça na cidade, é Economia Criativa.


CMN: A gente não tem noção mesmo da abrangência, do que isso pode significar.
Bianca:
Essa coisa de levar o conceito para os 11 distritos é o nosso foco maior. É trabalho, mas que vai ser gostoso de fazer. Somos apaixonados pelo impacto que gera nas pessoas, você conseguir trazer renda para alguém é dignidade. Eu falo que quando a gente trabalha com o que a gente gosta, a gente vai conseguir trabalhar. Pode ter os problemas, mas sempre vamos transpor aquela dificuldade.


CMN: É o criativo buscando soluções.
Bianca:
Sim, também, mas a gente vai ficar feliz trabalhando, vai ter a renda, que eu falo que quando a gente tem as contas pagas é uma paz. Então, conseguir levar isso para a população, o entendimento de que você pode fazer algo que você goste e ganhar dinheiro com isso, não tem preço.

Saiba mais sobre o instituto no site - https://institutoleacampos.org/