Fundada em 29 de outubro de 1810 por Dom João VI, no Rio de Janeiro, a Biblioteca Nacional do Brasil carrega um símbolo poderoso: o de uma nação que nasceu da transposição de uma monarquia europeia e, junto dela, herdou o valor simbólico dos livros e do saber – apesar do atraso do acesso para o povo brasileiro, porém, mais de dois séculos depois, essa mesma população ignora esse espaço de conhecimento. 

Reconhecida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), como uma das dez maiores bibliotecas do mundo e a maior da América Latina, a Biblioteca Nacional abriga um acervo estimado em 10 milhões de itens, entre livros raros, manuscritos, mapas, entre outros. Contudo, a grandeza contrasta com a realidade da cultura de telas e consumo de conteúdos superficiais, um dos motivos que faz a leitura engatinhar, e as bibliotecas, esquecidas, se tornam cemitérios de papeis, perdendo a identidade da vida das palavras guardadas. 

O Dia Nacional do Livro, celebrado na data de sua fundação, na última quarta-feira, deveria ser mais do que uma efeméride simbólica, mas um convite à crítica. O Brasil, país que abriga uma das maiores bibliotecas do planeta, ainda luta contra índices alarmantes de analfabetismo funcional e de desinteresse pela leitura. A ironia é evidente: enquanto a Biblioteca Nacional do Brasil preserva o passado literário e científico da nação, o seu povo o ignora. Celebrar a Biblioteca Nacional é também questionar o modo como tratamos nossa herança intelectual. 

O descaso com à cultura, os cortes em políticas públicas e o abandono das instituições de memória, ameaçam não apenas os livros, mas o próprio sentido de futuro do nosso povo. Uma nação que não lê, não pesquisa e não preserva a história, corre o risco de tornar-se refém da ignorância e repetir os mesmos erros. Mais do que comemorar, precisamos incentivar a nova geração em busca desse tesouro, um mísero pedido do aniversariante.


Marcelo Barbosa é jornalista, pedagogo e psicanalista. Autor da trilogia “Favela no divã” e “A vida de cão do Requis”.