No meu último livro “A vida de cão do Requis”, compartilho uma história entre um analista e analisando, sobre o conceito “Complexo de Vira-Lata”, criado pelo recifense com coração carioca, Nelson Rodrigues, artista incrível que foi escritor, jornalista, romancista, teatrólogo, contista e cronista de costumes e de futebol brasileiro, considerado o mais influente dramaturgo do Brasil.
Nessa concepção que deveria entrar nos vocabulários de psicanálise, Nelson se refere ao trauma sofrido pelos brasileiros, após a derrota da seleção brasileira para o Uruguai, na Copa do Mundo de 1950, dentro de casa, no Maracanã, onde desde então, tem sido associado a uma visão negativa e autocrítica da identidade nacional, uma “síndrome” que se manifesta na autodepreciação da cultura, do povo e das realizações brasileiras, muitas vezes em comparação com padrões estrangeiros.
Nelson utilizou ainda esse conceito, com a metáfora do vira-lata, um cachorro sem raça definida, para ilustrar essa falta de identidade e autoconfiança, inspiração da minha obra literária, onde, em geral, no caso da vida psíquica, com o mecanismo de defesa que o ego desenvolve para lidar com situações angustiantes ou ameaçadoras, seja de origem interna (impulsos, desejos) ou externa (ameaças percebidas), muitas vezes, fazendo o indivíduo esquecer de suas qualidades, fenômeno esse, que me atinge na área literária.
Desde que conheci esse meu talento como escritor, os meus livros são mais consumidos e vendidos fora do Brasil, venho recebendo contatos e convites internacionais para falar sobre as minhas obras, sendo chamado várias vezes de algo que nunca pensei: intelectual brasileiro, crítico social ou ainda crítico psicossocial – essa última até interessante.
Porém, apesar de concordar com o Nelson sobre a nossa cultura supervalorizar o que é de fora, ao que se refere a leitura de livros em nosso país, a vida de escritor me apresenta que em outros solos, eu sou melhor. Desculpe, Nelsinho.
Marcelo Barbosa é jornalista, pedagogo e psicanalista. Autor da trilogia “Favela no divã” e “A vida de cão do Requis”.
