O Brasil já foi diferente. Não ideal, mas diferente. Existia um cuidado maior com a questão da ética, até mesmo no universo da política, universo esse que nunca gozou de muita admiração da sociedade como um todo.

Vou dar só um exemplo disso. Em 1994, o então ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, Rubens Ricupero, renunciou ao cargo após o vazamento de uma conversa com um jornalista da Rede Globo, episódio conhecido como “escândalo da parabólica”. Na época, disse ele: "Eu não tenho escrúpulos: o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde".

Pois bem. Isso comparado ao que vemos, ouvimos e lemos hoje, parece um nada. Tivemos inúmeras autoridades gravadas confessando coisas muito mais sérias, sem que isso tivesse tido desdobramentos compatíveis.

Por exemplo. Quando Temer era presidente da república, foi acusado por Joesley Batista (JBS). de incentivar o pagamento de R$ 500 mil ao ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para que não revelasse informações à operação “lava jato”. O empresário reuniu-se com o presidente no Palácio do Jaburu numa noite de março, sem se identificar na entrada, e gravou a conversa. 

De lá para cá, as mentiras e as fake news têm ocupado espaços cada vez maior em nossas vidas. Estamos hoje diante da enorme polêmica sobre a PEC 3/2022, aquela que segundo diversos especialistas abre espaço para privatização de praias no país. Ela prevê a transferência gratuita de terrenos da marinha para estado e município. E estes podem transferir essas propriedades para grupos da iniciativa privada construírem condomínios, resorts e cassinos, dificultando o acesso da população a esse espaço que é o mais democrático que existe no nosso país.

Mas os defensores dos interesses da especulação imobiliária, interessados nessa verdadeira negociata, dizem que não existe nada na PEC que aponte para isso. Os empreendimentos teriam que obedecer a legislação ambiental, e o acesso das pessoas as praias seriam garantidos. E quem garantiria isso? Lembram daquela provocação em relação aos produtos vindos do Paraguai? “La garantia soy yo”.

Se não, vejamos como eles mentem. No governo Temer foi feita uma flexibilização dos direitos trabalhistas com a promessa de que isso geraria milhões de empregos. Saldo zero. O empresário não contrata trabalhador porque ele está barato. Empresário contrata trabalhador quando ele precisa produzir mais.

Outra. As empresas aéreas vão cobrar bagagem e isso vai diminuir o preço das passagens. As bagagens passaram a ser cobradas e as passagens aéreas nunca foram reduzidas. 

Eles mentem, são pilhados cometendo falcatruas, mentiras, mas não renunciam mais.

 

Afonso Pola (afonsopola@uol.com.br) é sociólogo e professor