O mundo de hoje merecia a existência do Stanislaw Ponte Preta. Esse era o pseudônimo de Sérgio Porto (1923-1968), cronista, radialista, homem de TV e compositor. Seu olhar debochado sobre a vida social e política marcaria o humor brasileiro.

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Sua carreira teve início no fim da década de 40, quando começou a participar do Jornal Última Hora, do Diário Carioca, Tribuna da Imprensa, revista Manchete e revista Sombra.

Tinha uma ligação estreita com a música e foi ele que redescobriu Cartola. No ano de 1957, Cartola havia desaparecido e trabalhava como lavador de carros e vigia de um edifício no bairro de Ipanema. Então, foi reconhecido por Sérgio, que começou a ajudar o músico a retornar aos palcos e retomar sua carreira. Além disso, publicou artigos sobre Cartola em jornais de grande circulação.

Além de suas contribuições para a música, Sérgio era também um grande crítico da ditadura militar. Com um senso de humor refinado, fazia críticas contundentes ao sistema de governo, à moral de sua época e aos costumes burgueses. 

Uma de suas criações mais inovadoras foi o Festival de Besteira que assola o País (FEBEAPÁ). O objetivo deste projeto era a simulação de matérias de jornal que criticavam a repressão dos militares com sarcasmo. Em um dos textos, Sérgio noticiou a prisão de Sófocles, um dramaturgo grego, pelos militares, que acusavam suas peças de apresentar conteúdo subversivo. 

Imagina quantos volumes desse livro ele não escreveria além dos três que ele escreveu, com tanta matéria prima a nossa volta. E olha que, no campo das ideias, aquilo que indignava as pessoas durante o regime militar não é nada perto daquilo que temos hoje. 

Figueiredo, por exemplo, último presidente militar (de quem o negacionista Alexandre Garcia foi porta voz) tem duas derrapagens mais famosas: “prefiro cheiro de cavalo a cheiro de povo” e “vou fazer desse país uma democracia se não eu prendo e arrebento”.

Ele era general da cavalaria e não foi expulso do exército com baixa patente por transgressão grave ao Regulamento Disciplinar do Exército (RDE). Bolsonaro sim, foi aposentado como capitão com apenas 33 anos, por transgressão grave ao Regulamento Disciplinar do Exército. 

O que diria Stanislaw vendo o país recheado de homens públicos que acreditam que a Terra é plana, que não existe aquecimento global por mais que a natureza produza eventos climáticos severos e que determinados cristãos evangélicos fazem “marcha para Jesus” enfeitando o caminhão de som com a bandeira de Israel, uma estado com uma religiosidade que, terminantemente não reconhece Cristo como filho de Deus.

É muita esquizofrenia para o Stanislaw dar conta.

 

Afonso Pola (afonsopola@uol.com.br) é sociólogo e professor