Vivemos em um país que convive com muitas feridas herdadas desde o início da nossa colonização. São inúmeras mazelas sociais que desenham o perfil da nossa sociedade. Entre essas feridas que acompanham nossa história, a discriminação racial contra o povo preto é, com certeza, a mais cruel. As estatísticas não deixam dúvidas. O Brasil é, sim, um país muito racista.
O desabafo da mãe de uma criança de 5 anos foi de cortar o coração. "Mamãe, um dia eu vou ficar branco?", perguntou criança negra chamada de "cocô" por colegas de escola em São Paulo. No Instagram, a mãe do menino declarou ser a coisa mais dolorosa de ouvir.
Ninguém nasce racista. As pessoas se tornam racistas a partir de valores assimilados no convívio com pessoas racistas e próximas. As crianças que fizeram isso com esse menino são frutos de uma educação deformadora de caráter. Apesar da percepção de que crianças pequenas sejam incapazes de atos discriminatórios, elas crescem em uma sociedade estruturalmente racista e que reproduz essa lógica em diversos espaços e situações.
As posições subalternas da sociedade são, na maioria, ocupadas por negros e indígenas. Eles são as vítimas preferenciais da pobreza e da violência. Os brancos, no extremo oposto, dominam o topo da pirâmide social. Trata-se de uma realidade que começou a ser construída nos primórdios da colonização europeia.
Já faz bastante tempo que o nosso país apresenta os sintomas de uma severa crise de valores. E esses sintomas são reveladores de um processo que se inicia em casa, com aquilo que chamamos de "exemplo". Meu pai costumava dizer que "se os conselhos conduzem, os exemplos arrastam".
Volta e meia temos notícia de venda de vagas para cursos de medicina. Óbvio que uma rapaz ou uma moço, em idade de iniciar um curso superior não tem condições de arcar com isso. Portanto, esse é um negócio de família. Que ética podemos esperar de alguém que se torna médico a partir desse expediente?O comportamento familiar é inspiração para o comportamento dos filhos.
Afonso Pola é sociólogo e professor.
