Nossa história está repleta de "mudanças" que nada mudam. O "descobrimento" só o foi para portugueses e europeus conquistadores: em 1500, havia gente aqui, de diferentes etnias e culturas. Nossa independência foi liderada por um príncipe português, que abdicou do trono brasileiro para ocupar o de Portugal: Pedro I cá, Pedro IV lá. Deodoro, o que desembainhou a espada para proclamar a República, tinha grande admiração por Pedro II. A República sempre teve mais oligarquia que povo, e a Revolução de 1930 foi feita "antes que o povo a fizesse", segundo um dos seus líderes, Antonio Carlos, presidente da província de Minas Gerais.
Faço essa memória porque estou entre os que não têm o menor otimismo com um eventual governo Michel Temer. Ele é do PMDB, partido que não tem tradição de zelo pela moralidade pública. Seu "gestor de recursos humanos", tarimbado na tarefa de fazer articulação política, mapear cargos e distribuí-los, é Romero Jucá. Seu vice será ninguém menos que o famigerado Eduardo Cunha.
Na Câmara, na sessão de domingo, o que se viu foi saudosista da ditadura falando em democracia, corrupto defendendo a ética, fundamentalistas usando o nome de Deus em vão, patriota dizendo-se único dono da Nação, elogios à Lava Jato vindos de investigados por ela, clientelistas jurando que não votavam por cargos. Tudo sob a liderança do réu Cunha, que, ao proferir seu voto, teve a desfaçatez de "pedir a Deus misericórdia para o Brasil".
A "Ponte para o Futuro" de Temer prevê desvinculação de receitas da Educação e Saúde, do salário mínimo ao crescimento do PIB, e a prevalência do acordado sobre o legislado, além de um ajuste "puro e duro". De quebra, estaria sendo articulada a limitação da Lava Jato, com nossa "Mãos limpas" ficando de mãos atadas.
O que se vislumbra, portanto, é mais do mesmo, respaldado pelo forte "sim" à continuidade do abismo entre Estado e Sociedade. Urge uma reforma política radical, com chamamento ao povo para decidir nosso destino. Sem isso, uma nova crise estará ali na esquina nos esperando.