Na rua, o senhor de sempre, anunciava: Olha o sonho, olha o sonho! Dentro de casa, você cantava a plenos pulmões, para que, à falta de dinheiro para suprir a vontade do seu garotinho, que vez ou outra provava da iguaria, não ouvisse a propaganda!
Tempos difíceis! Não me lembro bem, mas me parece que sua voz por instantes falseava, uma furtiva lágrima entrecortava a canção, por certo, seu imenso coração se apertava. Tudo era suprido, no entanto, quando, deixando de lado os afazeres domésticos que tanto lhe exigiam, me levava ao sofá, e, abrindo um livro qualquer, lia-me uma historinha! O sono vinha depressa!
Os anos passaram céleres! Já maiorzinho, ao experimentar as primeiras decepções, corria ao seu colo benfazejo na procura de uma canção qualquer, daquelas que, como a de outrora, viesse a me fazer esquecer do que se passava lá fora. Ao invés disso, no entanto; calado o som melódico; ouvia palavras de incentivo, sentia suas mãos em meus cabelos, e, quando não me enxugava as lágrimas, ao menos chorava comigo!
E o que não dizer das noites, antes de entregar-me ao reconfortante descanso! O barulho dos chinelos arrastados pelo pequeno corredor que separava nossos quartos, prenunciava a colocação do cortinado, o estirar do cobertor, o beijo do fim do dia, e, uma vez ou outra, o "te amo"!
Confesso que, à sua saída, na insegurança de menino, peguei-me, tantas vezes, em pranto aberto, ao imaginar quando você se fosse, quando o meu porto seguro já não existisse! Foi você a responsável pelo meu grande aprendizado! Ensinou-me desde as primeiras letras, à reza noturna. Mostrou-me, com seus gestos simples e exemplos os mais edificantes, a cultivar a igualdade, a ter o caráter obrigatório, a manter-me firme nos trilhos que achei por bem cursar, a ser, enfim - com os erros e acertos -, o homem de hoje!
Professoras, sim, as tive! Lembro-me delas com carinho! Mas, entre as névoas da saudade, no dia a elas consagrado, não poderia deixar de homenageá-la, minha sempre querida mestra. Onde estiver, o beijo do filho reconhecido!