Em sessão solene realizada na última quinta-feira (21), a Câmara de Mogi das Cruzes realizou a cerimônia de entrega de medalhas do “2° Prêmio Paz e Liberdade”. Iniciativa da vereadora Inês Paz (PSOL), a honraria obedece ao Decreto Legislativo n°. 199/2024 e tem como objetivo valorizar as crenças de matrizes africanas e combater a intolerância religiosa. A data escolhida — 21 de março — faz referência ao “Dia Internacional Contra a Discriminação Racial”, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) em referência ao massacre ocorrido em 1960 na África do Sul, onde 69 pessoas negras foram mortas por protestarem pacificamente contra a segregação racial.

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O “Prêmio Paz e Liberdade” homenageia personalidades, instituições ou empresas que tenham se destacado no combate à intolerância religiosa, na promoção da laicidade do Estado, na difusão da cultura negra e das religiões de matrizes africanas e na defesa dos valores constitucionais fundamentais.

Os trabalhos legislativos foram conduzidos por Inês Paz, com o vereador Iduigues Martins (PT) na primeira secretaria. Além deles, ocuparam a mesa diretiva o prefeito Caio Cunha (Pode), Expedito Tobias — representando o deputado estadual Marcos Damásio (PL) —, “pai” Danilo de Oxalá e Lindenberg de Nkossi, organizadores da cerimônia, padre Douglas Pinheiro de Lima, pastor Berlofa, da Igreja Garagem, Antônio Basílio Filho, advogado do Idafro (Instituto da Defesa dos Direitos das Religiões de Matriz Afro), e Ynjá Lunside, zeladora da Casa Culto Afro Brasileiro Yá Ogunté.

Inês Paz explicou os motivos de instituir o tributo Paz e Liberdade: “É uma sessão bastante representativa e brasileira, que traz à tona a nossa ancestralidade. Decidimos criar esta solenidade para, entre outros motivos, combater o racismo estrutural, que passa de mansinho muitas vezes. Que não é explícito, mas muito agressivo. Não podemos nos calar. Houve racismo religioso em escola estadual de nossa cidade. Por tudo isso, o plano municipal de educação não poderia ter ficado sem aulas para combater o racismo, a violência de gênero e a lgbtfobia. Parafraseando Angela Davis: ‘Não basta não ser racista. É preciso combater o racismo’”.

Por sua vez, o prefeito disse que fez questão de comparecer: “Todos os cumprimentos, de todas as religiões, representam o respeito. Recebi questionamentos de por que eu viria, uma vez que sou evangélico. Não poderia deixar de vir. Não poderia faltar a essa solenidade, uma vez que as religiões africanas propagam a paz. Quando soube da emenda feita ao Plano Municipal de Educação, eu repudiei aqueles vereadores que fizeram essa retirada. Não há nada mais transformador do que o amor e concordo com a vereadora Inês: lições contra o preconceito precisam ser ensinadas nas nossas escolas”.

Em seguida, falou “pai” Danilo de Oxalá, um dos organizadores da solenidade: “Peço a benção de vocês. É importante homenagear quem constrói a história. É bom lembrar que nosso passado é sangrento: nossos ancestrais foram mortos, massacrados, queimados e torturados. Mogi não é uma cidade apenas cristã, eu não sou cristão, mas eu respeito a fé dos meus irmãos”.

Lindenberg de Nkossi também se manifestou. “É muito bom reverenciar os passos daqueles que já caminharam muito, como a mãe Leonor, que tem 94 anos. Também valorizamos e incentivamos os jovens, aqueles que estão iniciando no caminho. Precisamos de liberdade de fé, de gênero, para se alimentar etc. A ONU criou esse prêmio por causa da luta contra o apartheid. Precisamos de respeito à nossa fé nas ruas, nas escolas e em todos os lugares. Precisamos de representantes de matrizes africanas na política. Racismo não é uma luta de pretos, e sim de todos”.

 O vereador Iduigues discursou sobre a importância de suplantar o ódio. “Hoje é o Dia Mundial contra a Discriminação Racial. Hoje, o Governo Federal lançou o programa ‘Juventude Negra Viva’. Os jovens negros são os que mais são mortos. É bom lembrar que nossos antepassados foram sequestrados na África e escravizados. Que nenhum templo mais seja depredado, que nenhuma criança mais seja discriminada por usar colar de contas, que sejamos todos resistência”.

Pastor Berlofa falou sobre história e preconceito. “Estou constrangido por estar aqui. Sou homem, branco, cis e pastor evangélico. O constrangimento vem porque eu sei o que homens como eu historicamente fizeram. Temos na entrada de nossa cidade uma homenagem aos bandeirantes, donos de escravos e estupradores. Como porta-voz dos oprimidos, trago um grito nesta noite: salvem os palestinos!”.

Antônio Basílio Filho, advogado do Idafro, foi mais um a se pronunciar. “A Umbanda e o Candomblé aguentam no lombo o que fazem com as nossas religiões. Somos fortes. Nem todas as igrejas profanam contra nós. Há problemas muito sérios com as igrejas neopentecostais. Hoje, quando ligamos as televisões, depois das 22 horas, não há outra coisa senão programas evangélicos, que fazem lavagem cerebral contra as religiões de matrizes africanas. Nossa religião é o bem, prega o amor, a caridade e a família. Nunca atacamos outras religiões”.

Também usou a palavra o padre Douglas Pinheiro de Lima. “Atendi prontamente o convite para esta noite. Embora eu tenha nascido em família católica de berço, eu tive a oportunidade de conhecer de perto as religiões de matrizes africanas nos anos 90. Meu caminho mudou em algum momento. Voltei à religião dos meus pais e hoje sou muito feliz. É de boa índole jamais se cuspir no prato em que comeu. Faço votos para que vocês tenham coração de perdoar a nós católicos, já que a Igreja teve sua parcela de culpa”.

Por fim, falou Ynjá Lunside, zeladora da Casa Culto Afro Brasileiro Yá Ogunté. “Quero falar sobre a mulher preta, sempre desvalorizada e sempre atacada. Mas temos muitas referências de mulheres que lutaram. Somos pretas, macumbeiras, lutadoras e libertárias. Viemos para vencer. Axé a todos nós”. A solenidade contou ainda com apresentações de danças e músicas. 

 

Receberam a medalha “Prêmio Paz e Liberdade” os seguintes homenageados:

MÃE LEONOR;

MÃE ANA DE OXOSSE;

MÃE KARINA;

MAKOTA AIGLA DE ZAZI;

MAMETU IRACEMA DE KAIA;

MAMETU BEREQUENÃ DE NKISI;

MÃE JÚLIA DE OXUM;

PAI SERGIO RIBAS DE NKOSSI;

YALORIXÁ SOCORRO DE OYÁ;

BABALORIXÁ LUIZ GARÇA DE IEMANJÁ;

O BABALORIXÁ VANDO DE OXUM E O BABALORIXÁ BOBY DE OSSAYN;

OGÁ MALAQUIAS DE XANGÔ;

MADRINHA SUELI DE JUREMA;

PASTOR BERLOFA;

ARTISTA E EDUCADORA PAMELA CARMO;

PAI VARELLA.