As regras do distanciamento social estabelecidas pelos governantes apontam, como principais necessidades, o trabalho remoto, aprimoramento das medidas de higiene e afastamento físico. Esses preceitos, no entanto, parecem ser mais facilmente seguidos pelas classes A e B da população (pouco menos de 15% dos habitantes do país), que, geralmente, contam com uma reserva financeira e, mesmo em situação mais difícil, como nesse momento de pandemia causada pelo coronavírus, conseguem cumprir as determinações do governo do Estado de São Paulo com mais tranquilidade em relação aos moradores das periferias.
Não é à toa que os panelaços a favor do isolamento social e fechamento do comércio são mais percebidos longe das regiões periféricas. Segundo explicou o historiador e professor da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), Mário Sérgio de Moraes, este é um tema de caráter político que elucida ainda mais a desigualdade social. "A má distribuição de renda continua sendo o principal problema no que diz respeito às carências da população, resultante da falta de um olhar social dos poderes estatais", pontuou.
A desigualdade social, gerada pela má distribuição de renda, resulta nas dificuldades estruturais apresentadas nas residências mais pobres. As pessoas que vivem em situação de maior vulnerabilidade social residem em casas pequenas, impossibilitando o distanciamento social entre os familiares. "Além disso, ao contrário da classe socioeconomicamente superior, muitas pessoas de baixa renda exercem trabalhos informais e não podem se afastar das atividades. Problemas como este não acontecem com pessoas que possuem poder aquisitivo maior, já que têm salários altos e direitos trabalhistas garantidos por leis", acrescentou o professor Moraes.
Culturalmente, as pessoas que vivem em periferias formam uma comunidade mais unida do que em bairros mais ricos. Festas e comemorações, por exemplo, são mais comuns em bairros periféricos do que em regiões centrais. O historiador Mário Sérgio de Moraes explicou que um dos motivos para esse cenário é a defasagem da promoção à cultura e lazer para a população carente. "Sem opção, moradores de periferias têm como a única forma de diversão as reuniões frequentes com amigos e familiares, nas ruas ou quintais. Já em outras regiões, a população têm acesso a parques ecológicos, museus e cinemas. É por este motivo que os moradores de classes baixas criaram essa cultura de reunião", concluiu.
Em Mogi das Cruzes, o local onde os casos de coronavírus ocorrem com maior incidência é Jundiapeba, distrito periférico. O sociólogo e professor Afonso Pola afirmou que a alta quantidade populacional de moradores de baixa renda está atrelada ao aumento dos casos da doença. "Na medida em que um distrito concentra muitas pessoas que, em maioria, não possuem condições para os cuidados necessários para conter o vírus, os casos tendem a ocorrer com mais frequência, o que não acontece em classes economicamente superiores", disse o sociólogo.
Compreende-se, a partir desses apontamentos, as diferenças entre as classes socialmente mais favorecidas das menos favorecidas em cumprir as medidas do isolamento social. "Percebo que, infelizmente, as classes mais vulneráveis são as que mais sofrem em quaisquer outros temas vivenciados em nossa sociedade, não sendo diferente nesta pandemia", concluiu Afonso Pola.
*Texto supervisionado pelo editor.