Em sua 16ª edição, o Festival de Cinema Francês do Brasil, antes conhecido como Festival Varilux, reafirma a vitalidade do intercâmbio audiovisual entre França e Brasil, reunindo artistas, estreias exclusivas e debates sobre temas que atravessam fronteiras. Com sessões em 59 cidades brasileiras, o Festival segue até o dia 10 de dezembro, consolidando-se como um dos maiores eventos de difusão do cinema francês no mundo e reforçando o Brasil como território estratégico para cineastas, produtores e distribuidores francófonos. Este ano, dois nomes chamam atenção do público: o diretor Jean-Claude Barny e a atriz Isabelle Huppert, uma das maiores intérpretes do cinema mundial. Barny desembarca no país com Fanon, filme que estreia em março de 2026 nos cinemas brasileiros, distribuído pela Fênix Filmes, e que já ultrapassou 300 mil espectadores na França. O diretor esteve em sessões com o público e veio também ao Brasil participar da Festa Literária das Periferias (Flup). A obra ilumina um período específico o da trajetória intelectual e política de Frantz Fanon, psiquiatra martinicano e referência incontornável do pensamento anticolonial. O longa se concentra nos anos em que Fanon atuou como médico no Hospital Psiquiátrico Blida-Joinville, na Argélia, entre 1953 e 1957. Convivendo com os efeitos psicológicos da violência colonial e da Guerra de Independência, o jovem psiquiatra aprofundou reflexões que ecoariam em Pele Negra, Máscaras Brancas e Os Condenados da Terra. Sua atuação clínica, somada ao engajamento na Frente de Libertação Nacional (FLN), tensionou sua própria prática profissional. Em 1957, Fanon foi expulso da Argélia e se exilou na Tunísia, de onde continuou atuando politicamente até morrer, em 1961, sem ver o país finalmente independente. Diretor Jean-Claude Barny apresenta filme Fanon no Festival de Cinema Francês do Brasil. Foto: FIFM Marrakech/Divulgação Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, Barny descreveu a emoção de apresentar o filme ao público brasileiro.  “Estou muito feliz de apresentar Fanon no festival. É um filme muito importante para a minha comunidade, eu sou natural de Thiès, e também para o Brasil. O pensamento de Fanon é historicamente essencial, especialmente nos tempos atuais.” O diretor explica por que escolheu retratar apenas um recorte da vida do autor. “Escolhi esse momento porque é aí que ele encontra verdadeiramente a colonização. Ele percebe o impacto psíquico devastador sobre os colonizados. Fanon é muito conhecido como escritor, mas pouco lembrado como médico psiquiatra, e isso era essencial para mim.” Para Barny, Fanon permanece um pensador global. “Não é só no Brasil. Na Amazônia, nos Estados Unidos, no Caribe, na África, na Europa… Fanon ressoa em todos esses lugares. Sua palavra continua necessária hoje” No Brasil, Fanon influencia debates sobre raça, desigualdade, violência, saúde mental e processos de emancipação — temas diretamente conectados ao público contemporâneo do festival. “Acredito que, se este filme ecoar aqui, é porque existe uma urgência. Fanon pode responder a muitas questões, tanto políticas quanto relativas à saúde mental”, conclui Barny.  Isabelle Huppert Atriz Isabelle Huppert destacou a importância da produção brasileira. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil Abrindo o festival com o filme A Mulher Mais Rica do Mundo, Isabelle Huppert, considerada pelo jornal The New York Times uma das maiores atrizes do planeta, conquistou a plateia com humor, elegância e disposição para dialogar com o público brasileiro. Em entrevista, a atriz destacou a importância da produção brasileira. “O Brasil deve se orgulhar de diretores como Walter Salles e Kleber Mendonça Filho. E fiquei encantada com o trabalho de Karim Aïnouz quando vi A Vida Invisível.” Ela também falou sobre longevidade artística e diversidade de papéis.  “Gosto de personagens distintos e mergulho em cada um com intensidade. Não sinto que exista etarismo no cinema francês; continuo encontrando papéis complexos e desafiadores.” Isabelle Huppert disse que adoraria filmar no Brasil.  “É claro, eu adoraria fazer um filme com um diretor brasileiro. Sempre amei viajar, encontrar cineastas de outros países. Tenho a impressão de que isso revela aspectos diferentes de mim e das histórias que contamos.” Novidades Emmanuelle Boudier, diretora e curadora do Festival de Cinema Francês do Brasil. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil Responsável pela curadoria do festival, Emanuelle Boudier reforça que a mudança de identidade visual não altera a essência do projeto.  “É exatamente o mesmo festival. Continuamos trazendo o melhor da produção francesa recente. São 20 filmes, 60 cidades e 90 cinemas. O nome mudou, mas a missão é a mesma”, explica. Uma das novidades desta edição é a exibição antecipada de Mãos à Obra, de Valérie Donzelli, antes mesmo de sua estreia na França. O filme venceu o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Veneza.  “Os brasileiros verão antes dos franceses. Isso mostra o prestígio do festival e a importância do público brasileiro”, diz Emanuelle.  Desde sua criação, o evento investe também na formação e no desenvolvimento de novos projetos. “Desde o início temos um laboratório de escrita de roteiros para coproduções franco-brasileiras. Este ano recebemos 222 projetos. A criatividade no Brasil é imensa.” Para Emanuelle, alcançar cidades fora dos grandes centros é parte essencial da missão. “O cinema é uma experiência coletiva: rir juntos, chorar juntos, compartilhar. Há cidades em que, se nós não vamos, simplesmente não há cinema francês. Levar essa diversidade cultural ao território inteiro é fundamental.” Relacionadas Filme O Agente Secreto chega aos cinemas em todo o país Filme Rejeito aborda violência que a mineração leva a cidades mineiras