Todos já ouviram, em algum momento da vida, das fábulas de origem árabe sobre as tamareiras - árvores que suportam os rigores do clima desértico, mas que demoram décadas até conseguir dar frutos. Como metáfora do empenho de longo prazo, elas representam um outro aspecto da sociedade: o esforço necessário e o compromisso com a criação de uma base sólida.

O problema habitacional no Brasil não é uma moda de verão: qualquer livro de história mostrará eventos desde o final do século XIX sobre a migração, déficit habitacional, o preconceito racial e outros fatores que contribuíram para a criação das primeiras favelas, que se tornaram símbolo da desigualdade racial e social no Brasil.

O mais recente caso de morticínio em uma comunidade do Rio de Janeiro, onde 19 pessoas foram mortas em uma ação policial no Complexo do Alemão, é o resultado desta equação que vem sendo escrita há mais de um século e que ninguém tem coragem de resolver.

Toda e qualquer iniciativa voltada para a redução do déficit habitacional e a consolidação de políticas públicas voltadas à dignidade de todos os moradores de todos os bairros de uma cidade pode e deve ser celebrada. Mas também deve ser acompanhada com interesse e zelo por toda a comunidade - da sociedade civil, dos meios de comunicação e das autoridades que se comprometeram a atuar de forma ativa.

O projeto habitacional apresentado pela Prefeitura de Mogi das Cruzes, com a promessa de realização de um novo cadastro habitacional para o mês de julho, é a semente de tâmara que poderá render frutos ao futuro da cidade. Mas para que esta semente germine, é preciso mais do que a vontade política: é preciso ter a humildade de saber que os nomes daqueles que se envolverem poderão se perder da memória durante a caminhada de longo prazo, e que sua vontade de contribuir deve ser maior que o desejo por aplausos ou aprovação pelo voto.

A árvore da habitação, como tantas outras em nosso país, foi negligenciada tempo demais. Que a nova geração se atente ao futuro e comece hoje a plantar o futuro.