Há mais de um mês desde o último debate realizado no Senado Federal sobre os direitos dos autistas, um levantamento feito com 50 mães de filhos com transtorno do espectro autista integrantes da entidade 'Resiliência Azul', realizado pelo MogiNews/DAT, revela desafios para a proteção legal aos autistas na região. Em Mogi das Cruzes, a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), prevista na Lei nº 13.977/20, por exemplo, contempla 48% do público pesquisado pela reportagem, ou seja, 52% não possuem o documento que facilita o acesso a direitos básicos e permite uma série de benefícios.

Na cidade, o equipamento de referência em educação para crianças e jovens autistas, a Escola Municipal de Educação Especial (EMESP) Profª Jovita Franco Arouche, atende hoje 470 alunos em sua sede na Vila Lavínia. Do total, 241 estudantes são diagnosticados com TEA, o equivalente a 51,2%. Já nas salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE), são atendidos 308 alunos, sendo 115 com TEA (37%). Os dados foram fornecidos pela Secretaria de Educação de Mogi das Cruzes com o DOP/Pró-Escolar.

Hoje, no Brasil, estima-se que existam cerca de 2 milhões de autistas, o que representa 1% da população total. Levando em conta a proporcionalidade, Mogi possui 4,5 mil autistas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) do ano passado (2021). 

Apesar de numerosos, os milhares de brasileiros com autismo têm dificuldade para encontrar acessibilidade e tratamento adequado, como aponta a pesquisa, realizada por meio da ferramenta Google Forms. Das 50 mães que responderam ao questionário, 78% alegaram depender do transporte coletivo e desse total 60,4% classificaram o serviço como inadequado.

Essa é uma das queixas das mães Miriele Correia da Silva, Deise Passos e Renata Martins. As três têm algo em comum: fazem parte da rede 'Resiliência Azul' e seus filhos foram diagnosticados com o TEA. Hoje elas transformam a sua luta diária em motivação para engajar outras famílias.

Mãe de um menino de 9 anos, Miriele contou que as dificuldades começam logo cedo. Ela, que depende do transporte coletivo para levar o filho para escola, serviço oferecido atualmente pela EMESP, conta que são recorrentes os casos em que precisa explicar a condição do filho para outros passageiros, já que alguns se incomodam com o seu comportamento.

"Um dia ele pisou sem querer no pé de uma senhora, e eu pedi desculpas por ele. Ela continuou zangada, resmungando, e eu fui explicar que ele é autista, aí ela devolveu 'mas como eu vou saber, eu não tenho como adivinhar, não está escrito na testa'. São situações recorrentes, que, na verdade, acontecem com qualquer criança. Além do incômodo e desconforto dele, é preciso ter muita paciência, as pessoas não têm o mínimo de empatia. É desgastante ficar explicando que ele tem autismo, porque as pessoas não se sensibilizam com uma condição que não é evidente, que não se vê", desabafou.

A Prefeitura de Mogi orienta que todos os responsáveis pelos estudantes com laudos emitam o Cartão de Transporte Coletivo PNE no PAC. Para casos em que há mais dificuldades para transportar o estudante e na existência de vagas, o município oferta transporte por meio de vans terceirizadas.

Educação

Deise, que é advogada e mãe de autista, revela que foi preciso entrar com recursos judiciais para que o filho conseguisse acessar o Plano de Ensino Individual (PEI) e ter um professor auxiliar na rede municipal de educação, sendo que esses serviços são garantidos pela Lei nº12.764/12.

"O professor não sabe como conduzir o aluno com necessidades especiais e muitas vezes tem mais de uma criança com deficiência por sala de aula. Não adianta ter leis e políticas públicas que dão direitos para os autistas, se essa lei não é aplicada", relatou.

Membro da rede de apoio 'Resiliência Azul', por meio da sua profissão, Deise também presta orientações jurídicas a outras mães acerca dos direitos da pessoa autista. "O PEI do meu filho, em decorrência da ação judicial, vai ter que ser refeito pela terceira vez. Pois, todos os PEIs apresentados no processo não eram efetivos para a aprendizagem dele. O Ministério Público até solicitou expedição de ofício para a Secretaria da Educação pedindo esclarecimentos quanto às orientações dos profissionais para a realização do plano. Nenhum dos documentos apresentados têm as informações necessárias", explica. De acordo com a advogada, a solicitação foi feita no início do ano letivo e ainda não foi atendida.

Segundo a Prefeitura, na educação, o processo de atendimento nas escolas que possuem Atendimento Educacional Especializado (AEE) ocorre da seguinte maneira: a unidade encaminha o estudante para triagem inicial que é realizada com fonoaudiólogas, psicóloga e fisioterapeuta. Após isso, é elaborado relatório e o estudante é incluído na lista de espera para atendimento e, na existência da vaga, os responsáveis são convocados para efetivar a matrícula e iniciar os atendimentos.

 Clínica-escola

Ainda de acordo com o Executivo, a cidade também conta com a construção de uma Clínica-Escola, equipamento inédito no Alto Tietê com espaços para uma educação interativa que irá atender as crianças, jovens e adultos que residem no município. A conclusão das obras está prevista para o ano que vem.