Faz quase 60 anos que Roger Vadim abalou a moral cristã vigente com o filme francês, lançado em 1956, "E Deus Criou a Mulher", devido às cenas eróticas de nudez da nova estrela Brigitte Bardot. Ela tornou-se o símbolo da beleza feminina, corpo da mulher movido pela sua voluptuosa sensualidade, até então escondido da grande tela do cinema pela burca da censura religiosa na sociedade da época.

Com o Renascimento, a liberdade de pensamento conseguiu romper o lacre do baú do conhecimento entesourado nos mosteiros da Idade Medieval, surgindo daí uma mescla de religiosidade humanística que permitiu reconhecer na mulher sua identidade feminina. Na metade do séc. XIX nasce a ginecologia com o objetivo de estudar e entender o sexo feminino. A metodologia científica deu os seus primeiros passos, no séc. XV, com Galileu, utilizada mais tarde pelos anatomistas e fisiologistas que buscavam, centrados no útero, órgão de poder da mulher para fabricar gente, desvendar os seus mistérios. Já era um bom começo, ainda, não revelado no todo.

Entre tese e antítese desejavam ver a mulher como mulher, coisa revelada e definida por Deus desde o princípio da Criação: "... homem e mulher os criou"(Gênesis 1:27). Em 1869, Francis Galton criou o termo eugenia, demonstrando que a ciência estava a serviço da sociedade na busca do aperfeiçoamento da raça. Karl Pearson defende a ideia que a multiplicação desordenada dos pobres ameaça a raça humana, sendo dever das raças superiores e intelectualizadas dominar as inferiores. Isso faz lembrar a frase contida no livro de Orwell "A Revolução dos Bichos" em que o líder da classe social dos porcos diz: "Todos são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros". Em 1912, Margaret Singer evoca o controle da natalidade com o propósito de libertação feminina. A romancista Simone de Beauvoir, companheira de Sartre, afirmava que a mulher não nasce mulher, mas é feita mulher, revolucionando, assim, o conceito de ser mulher na escalada cultural em que vive.

Mauro Jordão é médico.