Muito se diz, e pouco se reflete, sobre os méritos da democracia! Um deles, bastante óbvio, é, talvez, a forma mais charmosa de governo já inventada pelo homem. Razões é que não faltam. É baseada na proposição nada palpável: governo do povo, para o povo, e pelo povo! Povo? Como se ante a voracidade dos governantes isso fosse possível. Ou antepor o verdadeiro ao que, na realidade, de há muito deixou de ser verdade? E sempre, muito mais fascinante e satisfatório, para a grande maioria dos homens, do que aquilo que é verdade!

Toda verdade é áspera, alarma tolos e sábios, acompanhada de um ar de finalidade que colide com todo incurável romantismo em voga. Via jeitinho de plantão, faz com que os homens se vejam, em todas as grandes emergências da vida, escravos de velhas promessas, transparentemente falsas, mas obviamente reconfortantes. E de todas essas promessas antigas não há nada mais reconfortante do que aquela dirigida no sentido de que: os humildes herdarão a terra! Bandeira atrativa do sistema religioso dominante, e base do sistema político vigente. Eis, pois, a religião, conferindo à democracia, que aí está, crédito e autoridade ainda maior do que de qualquer mito!

Por outro lado todo homem de máfia, marginal ou oficial, seja elite ou o que for, funcionando como reles cidadão, tem a sensação de que, realmente é importante neste mundo capenga. Que realmente comanda tudo! Fora de seus devaneios sentimentais pós-maracutaias, chega a ter um senso de vasto e misterioso poder, que é o que fazem sabichões, religiosos, chefões do economês, graúdos duendes do PT e outros magníficos de estirpe equivalente, felizes dentro de sua nauseante indumentária. E de lá vem, a convicção de que, cada um, à sua maneira, é sábio! Que suas opiniões são levadas a sério por todos. Por outro lado, vem de fora a consciência brilhante do dever especial, triunfalmente praticado: o que faz de políticos e maridos traídos, galera dos pra lá de felizes!


Raul Rodrigues é mestre em Engenharia e ex-professor universitário.