Estamos na reta final do governo Bolsonaro. O Brasil de Lula terá de conviver com imensos desafios. No campo econômico, esse governo deixa, conforme estudo feito pela FGV, uma herança maldita de R$ 430 bilhões, fruto do descalabro fiscal promovido em busca da reeleição, valor esse que significa 4,2% do PIB brasileiro.

O problema fiscal inclui o furo no teto de gastos, perdas de arrecadação, custos financeiros e riscos agravados por ações consideradas populistas. Mas a nossa preocupação não se restringe apenas ao aspecto econômico. Nos quatro anos do atual governo, muitas feridas foram abertas e, precisaremos de paciência para curá-las.

Herdamos um país com um famigerado "orçamento secreto" que sangrou recursos públicos na compra de apoio de parlamentares. A novidade que começou em 2020, veio acompanhada de indícios de corrupção em gastos para aquisição de tratores, construção de escolas e exames médicos.

O Brasil vai ser entregue ao próximo presidente com um conjunto de informações sonegadas e acobertadas pela excrescência dos sigilos de 100 anos. Carteira de vacinação do presidente, visitas a Michelle, ficha do Queiroz e acesso de filhos do presidente ao Planalto são informações que estão sob sigilo.

Nas relações sociais, temos vários exemplos que indicam que a sociedade está gravemente doente. Conversas mantidas em um grupo de whatsapp por adolescentes de um colégio particular de Curitiba continham frases como: "quem vai ser o herói que vai matar o Lula"; "a 12 do meu pai chegou sexta-feira"; "vou atirar em feminista".

Em MG, um PM reformado agrediu uma criança de 7 anos após o menino dizer "Lula lá". Na cidade de São Paulo, a deputada Carla Zambelli e assessores, com armas em punho, perseguiram um homem negro.

Herdamos um país que voltou ao mapa da fome, e contaminado pelo negacionismo e pelas fake news. Um país onde a democracia é constantemente agredida e a ciência é contestada por uma legião de desinformados. Vamos ter que trabalhar muito para recuperar tudo o que foi perdido ou destruído.

Afonso Pola é sociólogo e professor.