Vivemos em um país que se consolida cada vez mais como o reino da hipocrisia. Antes menos maléfica, pois se restringia mais a prática comum de se falar bem das pessoas quando elas estavam presentes e depois criticá-las em sua ausência, hoje a hipocrisia assume contornos bem mais perversos.

Quando olhamos para os inúmeros escândalos, percebemos que a importância atribuída pela mídia muda dependendo de quem é o foco das investigações. O esquema de corrupção na Petrobras, por exemplo, foi abordado durante anos, enquanto outros foram caindo na vala da impunidade e do esquecimento.

Esse foi o caso da "Operação Zelotes", de 2015, que investigava um esquema de sonegação de impostos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Alguns estimam que os valores envolvidos talvez alcancem cifras maiores do que outros escândalos e na lista de suspeitos estão grandes bancos e empresas.

Também é importante citar a lista das contas polpudas e não declaradas no HSBC da Suíça e o uso de empresas conhecidas como "offshores" para movimentar seus recursos. Considerando as contas com saldos acima de US$ 50 milhões, estamos falando de algo em torno de US$ 2 bilhões em apenas dois anos.

Um ex-conselheiro do Carf disse que apenas os pequenos devedores pagam ao órgão. Os da lista do HSBC (e de outros bancos) dizem que sonegam porque os impostos não são transformados em bons serviços públicos. As empreiteiras dizem que só pagam propina para poder executar as obras. Ou seja, cada um usa a desculpa que lhe convém. Depois, todos vão ao templo de sua fé e juram amor ao seu Deus. Santa hipocrisia.

Não podemos deixar de citar os grandes devedores da Previdência Social, que devem quase três vezes o valor do déficit no INSS, como a JBS e a Caixa. Entre os cinco maiores estão três empresas já falidas: Varig, Vasp e Bancesa, banco cearense. E no final, os donos do capital é que patrocinam os políticos que fazem a reforma da previdência encurtando nossos direitos.

Afonso Pola é sociólogo e professor.