O Ministério Público (MP) instaurou um inquérito, em março deste ano, que investiga vícios em licenciamento ambiental para Supressão de Árvores e Aterro de Resíduos Inertes em Área de Preservação Ambiental (APA) nas várzeas do rio Tietê em Suzano, que corria em sigilo. O caso, no entanto, sofreu uma interposição de recurso contrário ao inquérito, que deverá ser apreciado pelo Conselho Superior do MP. O grupo julgará o mérito da acusação.
A Justiça foi acionada após o encaminhamento de uma notícia crime em março de 2022, movida pelo Movimento em Defesa da APA do Rio Tietê. Segundo o documento, por diversas vezes a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) teria mudado o posicionamento a respeito das solicitações feitas pela empresa Mogiana Mineradora para execução dos aterramentos, efetuadas por meio de "Licenças de Operações Precárias" (LOP), de modo a garantir o aterramento por 10 anos. Para o mesmo local da APA existe ainda um projeto de loteamento aprovado pela Prefeitura de Suzano, que seria executado posteriormente.
Segundo a notícia crime, a acusação é agravada pelo fato de que o processo de licenciamento corria sob sigilo, que foi quebrado por meio de uma denúncia feita na Delegacia do Meio Ambiente de Mogi das Cruzes.
Após obter vistas ao processo, o Movimento constatou que o Conselho Gestor da APA do rio Tietê, que possui caráter consultivo, não havia sido consultado sobre o caso, bem como o Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê e o Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Condema), ambos de caráter deliberativo. O movimento entende que o sigilo é inconstitucional, e que há evidências de crimes como prevaricação (Lei Federal nº 9.605/1998) e fraude (nº 9.605/1998).
Entenda o caso
A Gleba 4 da avenida Miguel Badra c/n, bairro Cidade Miguel Badra, em Suzano, localizado em área de APA de várzea do rio Tietê, foi arrendada pela Imobiliária Mediterrâneo, de Guarulhos, a Mogiana Mineradora de Areia e Pedra, em contrato que autoriza o aterro de inertes. O primeiro pedido para o aterro foi feito pela mineradora em 2016, quando a Agência Ambiental de Mogi das Cruzes indeferiu duas vezes sobre o caso após a empresa recorrer da primeira resolução. Em seguida, a mineradora foi ao Departamento Jurídico da Cetesb que, contrário ao parecer técnico, deferiu o pedido justificando que se tratava de um local de Zona de Uso Controlado (ZUC).
À época, a empresa pediu o sigilo "a fim de evitar pedido de vistas e cópias dos documentos anexados ao processo". Desta forma, somente a mineradora e agentes públicos teriam acesso aos altos.
A notícia crime destaca que o caso pode se tratar de um dos empreendimentos favorecidos pelo então secretário de Estado de Infraestrutura e Meio Ambiente, Ricardo Salles que, "inclusive, foi processado pelo Ministério Público Estadual, acusado de modificar mapas da APA Várzea do Rio Tietê para beneficiar empresas". Além disso, o ex-secretário, por meio da Resolução SMA n° 95, "concentrou em seu gabinete, as decisões que envolviam a APA Várzea do Rio Tietê".
Em janeiro de 2018, quando Salles já não estava mais à frente da pasta, o Departamento Jurídico da Cetesb mudou seu entendimento e indeferiu o pedido sobre a emissão de licenças ambientais, argumentando que a Divisão de Apoio de Gestão de Recursos Naturais indicou a inviabilidade ambiental para o aterramento, tendo em vista a fragilidade da área.
Mais uma vez a Mogiana Mineradora entrou com recurso, desta vez feita na Fundação Florestal (FF), que alegou não haver problemas para o aterramento, contrariando a resolução da Cetesb. Entretanto, o órgão já havia emitido parecer técnico anterior apontando que "o empreendimento em questão encontra-se em uma região caracterizada como: planície fluvial natural de fragilidade ambiental muito alta" e feito um mapa no qual caracterizava a área como de "altíssima ou alta vulnerabilidade à inundação".
Em abril deste ano, o deputado federal Ivan Valente (Psol), a vereadora de Mogi, Inês Paz (Psol), o ex-prefeito de Suzano e geógrafo, Marcelo Candido, e a ONG SOS Mata Atlântica, também entraram com uma representação conjunta contra a unidade da Cetesb em Mogi na Procuradoria da República em São Paulo, para pressionar as investigações.
*Texto supervisionado pelo editor