Que o Brasil foi o último país das Américas a abolir a escravidão é de conhecimento público. No entanto, é importante ressaltar que a abolição da escravatura em nossa pátria não quebrou todas as correntes. O preconceito racial não só resiste ao tempo, como tem se fortalecido. Está mais do que claro que vivemos um momento de muitos retrocessos em relação aos avanços conquistados.
Já se passaram 132 anos desde a assinatura da Lei Áurea e o Brasil ainda convive com a exploração de trabalho forçado. Só em 2019, foram mais de mil pessoas resgatadas. Segundo estimativa da organização não-governamental internacional Walk Free, o Brasil tinha, no mesmo ano, cerca de 155 mil pessoas nessa situação.
Temos apenas algo em torno de quatro dezenas de casos que resultaram em condenações por conta de trabalho escravo contemporâneo desde 1995, quando milhares de estabelecimentos rurais e urbanos foram fiscalizados por denúncias relativas a esse crime e 42 mil trabalhadores libertados. Não é do conhecimento público a informação de empregador que tenha cumprido pena na cadeia.
A ausência de punição rigorosa acaba incentivando a prática. Não é à toa que, pela primeira vez desde o início do registro dessas operações, a maior parte dos trabalhadores foi resgatada em estabelecimentos urbanos. Nesse caso, o setor de Construção Civil é o maior responsável pelas ocorrências. Se bem que em São Paulo, são inúmeros os casos no setor da Indústria de confecção. As denúncias envolvendo marcas como Zara, Collins, Pernambucanas, Marisa, C&A, M. Officer entre outras, são sintomáticas.
São centenas que integram Lista Suja. No entanto, a pressão de alguns segmentos produtivos, particularmente do setor do agronegócio, para o abrandamento da caracterização desse tipo de exploração permanece. De outro lado, o desaparelhamento da estrutura de fiscalização, provocado pela redução de pessoal e de recursos, tem contribuído e muito para a prática.
E que fique bem claro, esse é mais um fato que afeta negativamente nossa imagem mundo afora.