Nas vezes em que discuti o atualíssimo assunto da diminuição da maioridade penal, usei argumento forte, e à evidência, teratológico. No afã de demonstrar a inocuidade da medida, ponderei que, em razão da necessidade de o criminoso cooptar menores para as suas investidas, principalmente, no mundo do tráfico, chegar-se-ia a um ponto em que ao nascer a criança estaria sujeita à prisão. No entanto, o exemplo exagerado, figura de retórica com o condão de marcar posição, por incrível que pareça, encontrou eco em mentes que comandam o processo legislativo em território nacional. Com efeito, Laerte Bessa, deputado federal pelo Distrito Federal, para deleite de muitos imbecis, tenho certeza, acenou com "fabuloso e futurista projeto". Em entrevista a jornal estrangeiro, proclamou que em mais ou menos vinte anos a idade penal chegaria 14 anos, mais vinte, de 12, e assim se prosseguiria até o momento em que a ciência pudesse "descobrir, antes do moleque nascer se ele já é criminoso. Aí a gente não vai deixar ele nascer e já resolve o problema." Estivéssemos no campo da ficção - sequenciando-se, quem sabe, o conhecido "Minority Report -, mesmo que absurda, a consideração poderia ser aceita. Tenha-se em conta, no entanto, que o responsável pelo comentário é o relator da malfadada Proposta de Emenda Constitucional que pretende modificar a imputabilidade. Tenha-se em conta mais: nas várias vezes em que se manifestou sobre o tema, a demonstrar a seriedade do que defende, o senhor em questão alardeou que a diminuição para 16 anos já não contemplava as necessidades atuais. Adepto da linha de ação de seu presidente, Eduardo Cunha, Bessa foi além, ao incorporar ao ditatorialismo que impera naquela Casa de Leis, claras noções da eugenia nazista. Sob sua ótica, ao sofrido povo da periferia - onde, mercê do abandono governamental, se produz o grosso da "criminalidade pesada" - até o sagrado direito da procriação, seria negado. Preservar-se-ia a "raça pura". E olha que ele ainda se diz como um "representante do povo"!