Neste Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado hoje (5), o Alto Tietê vive o contraste entre a luta pela preservação, a pressão do avanço urbano e os impactos já visíveis da emergência climática. Com áreas de mananciais e trechos de Mata Atlântica, a região busca equilibrar crescimento e cuidado com o território. O Consórcio de Desenvolvimento dos Municípios do Alto Tietê (Condemat+) e organizações como o Instituto Ecofuturo — responsável pelo Parque das Neblinas, na Serra do Mar — conduzem ações voltadas a construir alternativas sustentáveis. A maior integração entre as cidades e ações com viés educativo são apontadas como caminhos para fortalecer essa causa.
A coordenadora da Câmara Técnica de Meio Ambiente do Condemat+, Solange Wuo, lembra que, apesar das diferenças entre os municípios, eles enfrentam problemas comuns, como descarte irregular de resíduos e ocupação de áreas de preservação, principalmente nas fronteiras. Ela destaca que o consórcio apoia a estruturação das políticas públicas locais e faz articulações para garantir recursos para as cidades da região, além da forte presença em fóruns pelo Brasil e aposta em projetos sustentáveis como o Recicla Cidade.
Apesar dos muitos desafios da região, Solange enxerga com otimismo o maior interesse da população na pauta ambiental. “Essa data é muito importante pra gente fazer uma reflexão e entender tudo que a gente precisa melhorar e mudar de uma forma rápida”, ressalta. "Hoje, a maioria dos municípios está com o calendário do mês de junho repleto de atividades. Então, as datas, elas são muito importantes pra gente reforçar, reverberar o tema meio ambiente com a população", complementa.
A emergência climática, segundo ela, já impacta a região, que enfrenta, por exemplo, tempestades cada vez mais fortes e intensas. “A gente tem essa questão muito preocupante: muita água vindo de uma vez, de forma violenta, e muitos ventos”. Além disso ela cita tragédias que aconteceram em territórios próximos, como os deslizamentos em São Sebastião, no litoral norte do Estado, em 2023, e as enchentes no Rio Grande do Sul, no ano passado.
Solange também alerta para a crise hídrica e a insegurança no abastecimento. O cinturão verde e a agricultura local, especialmente o cultivo de hortaliças, são os mais afetados, segundo ela. “Temos insegurança hídrica, a região depende ainda da chuva, a gente não tem um sistema de abastecimento super competente que dê conta se ficar num período de escassez”, alerta, ressaltando também os impactos na saúde pública, como o aumento de mortes por ondas de calor, que agravam problemas cardíacos e a hipertensão arterial.
De acordo com a coordenadora da Câmara Técnica, o Condemat tem intensificado os debates e propostas para enfrentar os desafios ambientais. “Fizemos a primeira Conferência Intermunicipal em junho do ano passado, com os 14 municípios do consórcio, envolvendo Conselhos Municipais de Meio Ambiente e Prefeituras. Saímos com várias propostas e elegemos delegados para a etapa estadual e depois para a Conferência Nacional”, conta.
A Câmara Técnica definiu dez temas prioritários que orientam os trabalhos regionais, entre eles gestão de resíduos da construção civil, coleta seletiva, compensação ambiental, ampliação de unidades de conservação, fiscalização, Cadastro Ambiental Rural (CAR) e estruturação de planos municipais. Em maio, essas propostas foram aprovadas na 5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente, em Brasília.
Diálogo entre cidades
O consórcio, segundo Solange, criou uma rede de apoio e troca de experiências, avançando em questões como a elaboração de planos municipais de educação ambiental — a maior parte das cidades já tem planos prontos ou em fase final. Também há esforço para consolidar conselhos e fundos ambientais. "É muito difícil trabalhar a pauta ambiental sozinho, mas os municípios têm se juntado por verem que isso dá resultado, inclusive para conseguir mais recursos junto ao Estado e Governo Federal", afirma.
A gestora destaca que a educação ambiental é central para a transformação. “Quando a comunidade participa, entende o valor do território, a conservação se torna mais sólida. Por isso, a educação ambiental precisa estar presente nas escolas, bairros e conselhos.”
Fóruns e projetos
O Condemat+ tem marcado presença em fóruns e apresentado projetos, como o Recicla Cidade, que foi destaque no Fórum ABRE de Sustentabilidade, em abril, na capital paulista. Implantado na área do Condemat+ em 2021, após projetos-piloto em Salesópolis e Guararema, a iniciativa formaliza cooperativas de materiais recicláveis, capacita catadores e conscientiza a população, fortalecendo a educação ambiental, gerando economia para as cidades e criando emprego e renda para populações vulneráveis. Em abril, uma comitiva do consórcio visitou Benevides (PA) para conhecer estratégias locais e iniciar uma nova etapa do projeto.
Outro projeto, que será lançado em setembro no Itaquá Rodeio Fest, é o “eco-ingresso” ou “green pass”. A ação, que fará parte das comemorações do aniversário de Itaquaquecetuba e poderá servir de modelo para outras iniciativas na região, permitirá trocar 2 kg de latas de alumínio por ingressos para shows. Desenvolvido com a ONG Espaço Urbano e inspirado no Benevides Recicla, o projeto visa incentivar a sustentabilidade e ampliar o acesso ao evento.
Instituto Ecofuturo
O Alto Tietê enfrenta desafios na conservação da floresta, prevenção de incêndios e conexão entre fragmentos de áreas verdes. Para Michele Martins, analista de sustentabilidade do Instituto Ecofuturo, criado pela Suzano, esses desafios são complexos, mas há avanços na participação das cidades e empresas, que demandam ações integradas envolvendo educação, ciência e comunidades. O Instituto Ecofuturo tem uma atuação importante na região do Alto Tietê, especialmente com a gestão de áreas privadas como o Parque das Neblinas e a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Botujuru.
“É nesses espaços que a gente acaba podendo contribuir mesmo com a experiência de gestão que a gente tem nessas duas áreas privadas, e como a gente pode falar dessa relação das pessoas com esses ambientes, que podem ser transformadores para o território como um todo,” explicou Michele.
Ela destaca que um dos grandes desafios ambientais da região é a conexão dos fragmentos florestais ainda isolados: “Temos um mosaico extremamente importante, mas esses fragmentos ainda são considerados distantes. Como a gente conseguiria pensar nesses corredores ecológicos? Já foram feitos projetos, mas é preciso que isso vire uma política pública, com planejamento integrado entre municípios, sociedade civil e empresas que detêm áreas importantes.”
Outro desafio apontado por Michele é a prevenção de incêndios florestais. “Essas áreas fragmentadas ficam mais frágeis, inclusive com a questão do fogo. A gente precisa trazer consciência para as pessoas, porque ações simples, como o lixo no terreno, podem causar incêndios que impactam significativamente essas áreas.” Ela ainda sugere a formação de brigadas comunitárias para ajudar na prevenção.
Sobre o engajamento do poder público, Michele é otimista: “Eu sou super positiva com o que tenho visto nos últimos anos. As discussões têm melhorado, e a gente tem prefeitos envolvidos em ações regionais, inclusive com programas que incentivam o uso de frutos nativos e a valorização da biodiversidade.”
Na educação ambiental, Michele destacou o programa “Meu Ambiente”, que desde 2010 atua em Mogi das Cruzes e se expandiu para Suzano e Bertioga. Segundo ela, o foco do programa é formar educadores para que eles possam “inserir a natureza na rotina das escolas, para que as crianças tenham contato com o ambiente natural e possam desenvolver uma relação mais próxima com a biodiversidade local.”
Michele destaca que datas relacionadas ao meio ambiente são essenciais para mobilizar as pessoas, reforçar a educação ambiental e mostrar que a conservação é tarefa contínua que depende do engajamento de todos.
Parque das Neblinas
Com cerca de 7 mil hectares de Mata Atlântica preservada, o Parque das Neblinas desenvolve pesquisa, educação ambiental, regeneração florestal e relacionamento com comunidades locais. Segundo a assessoria do Instituto, o parque abriga mais de 1.400 espécies de fauna e flora, incluindo o muriqui-do-sul, o sagui-da-serra-escuro e a onça-parda, ameaçados de extinção. Desde sua criação, o parque contribui para o conhecimento científico, com quatro espécies novas descobertas e dados sobre polinizadores, fungos, solos e dinâmica da floresta.
A assessoria traz dados também da regeneração florestal: mais de 8 milhões de sementes de palmeira juçara foram dispersadas para acelerar a recuperação da mata nativa. A planta é considerada essencial para a alimentação da fauna e dispersão natural das sementes.
A relação com a comunidade é reforçada pelo fato de que cerca de 85% dos colaboradores da reserva são moradores locais, e metade do orçamento retorna à comunidade via compras e serviços, fortalecendo a conservação e o desenvolvimento regional. Mais informações no site - https://www.parquedasneblinas.org.br/.
Galeria
Foto 1 - Comitiva do Condemat+ esteve no Pará para ampliar projeto sustentável