Outro dia, em conversa com um amigo, falando sobre a etimologia das palavras, ele me disse que o contrário de detalhe era atalho. E, recentemente, com um grupo de engenheiros preocupados com o ensino da nossa especialidade - projetos estruturais - caímos na conversa sobre algo que deixou isso bem claro.

Vivemos hoje pela facilidade dos equipamentos e programas de modelagem estrutural, andando por atalhos. Estamos deixando de prestar atenção aos detalhes. Não quero dizer, com isso, que devamos voltar aos cálculos exaustivos dos processos manuais. Não é preciso viajar a pé para ver a paisagem, mas conhecer o caminho a ser percorrido, e ter o controle do meio para parar nos pontos que consideramos importantes ou nos chamem a atenção. A beleza e o perigo moram nos detalhes.

Programas de modelagem são magistralmente elaborados por engenheiros e matemáticos que conhecem profundamente materiais, teorias de estabilidade, cálculos, algoritmos e normas técnicas para a elaboração de softwares capazes de dar respostas a todo tipo de projeto. Por isso mesmo são precisos, mas não podem ser específicos.

O modelo estrutural é uma abstração que busca reproduzir o funcionamento do objeto a ser executado. Ele, não necessariamente, se parece com o real, apenas simula o trabalho do sistema estrutural sob as ações a que estará sujeito. Esse conjunto de nós, barras e placas, é lido pelo programa com a abstração geométrica de pontos, segmentos de retas e planos, seus vínculos são criados pelo projetista. O programa o analisa, segundo a interação imposta entre eles.

Uma barra é um segmento de reta entre dois pontos, uma viga é um conjunto de barras em sequência entre dois apoios. Quem define isso no programa é o engenheiro. Uma vez dadas as informações, o programa vai criar uma matriz de rigidez, equalizar forças e deformações, calcular os esforços solicitantes, e sob eles, analisar essa viga sob condições de estabilidade, resistência e deformação, e considerá-la, ou não, adequada conforme a norma técnica escolhida. No entanto, não vai analisar a particularidade de um esforço localizado ou de uma ligação não padronizada. Isso cabe ao projetista.

Um programa de detalhamento estrutural vai determinar o número de barras de reforço do concreto para cada um dos esforços numa viga e distribuí-las de acordo com a necessidade de cobertura do diagrama e ancoragem. Fará isso para o momento positivo, assim como para o momento negativo, mas, como eventos distintos.

Cabe ao projetista a análise da possibilidade de distribuição dessas armaduras e da tradução de seu melhor arranjo no sentido de facilitar a leitura e execução em obra.

Temos, cada dia mais, tanto pela pressão dos prazos quanto pela tendência natural de buscar uma resposta rápida, a vontade de pegar um atalho.

Os programas de modelagem são cada dia mais completos, precisos e abrangentes, o que, de certa forma, nos encoraja a delegar a eles as verificações e detalhamentos. Só que não podemos soltar a direção sem prestar atenção às etapas. Cabe ao engenheiro a criatividade do lançamento do modelo estrutural, a escolha dos vínculos entre os elementos que compõem a estrutura, a definição das ações sobre ela, sua otimização de performance e a análise dos seus detalhes particulares. Aquilo que cada dobra, implica, que a cada desdobra, explica. Mapa não é território.

*Heloisa Maringoni é Engenheira Civil