A Advocacia-Geral da União (AGU) Ato que formalizou acordo de indenização à família de Vladimir Herzog teve participação de ex-presos políticos e foi realizado na véspera do dia em que o jornalista completaria 88 anos. O acordo prevê o pagamento de indenização por danos morais à família de Vlado, nascido na então Iugoslávia, hoje Croácia. Também entram no cálculo valores retroativos da reparação econômica paga à viúva de Vladimir Herzog, Clarice Herzog, obtida com uma liminar concedida pela Justiça Federal. O valor total devido à família é de R$ 3 milhões, além da manutenção do pagamento de prestações mensais. Ivo Herzog, diretor do Instituto Vladimir Herzog - Rovena Rosa/Agência Brasil Em entrevista coletiva, o filho de Vlado e Clarice, Ivo Herzog, lembrou que, na época da execução de seu pai, a AGU fez vista grossa à gravidade do caso, o que, segundo ele, exacerbou a vulnerabilidade de sua mãe, ao testemunhar sobre o caso na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). "Quando minha mãe teve que depor na corte, como parte do processo que resultou na sentença, ela foi constrangida pela AGU. As imagens são públicas. Como o ministro [da AGU, Jorge Messias] falou, a AGU vinha de maneira a criar constrangimento, porque levava a defesa do Estado ao limite e não tinha uma opinião humana sobre aquele processo", observou Ivo, que tinha apenas 9 anos de idade quando Vlado foi morto nas dependências do Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), e fundou o instituto, do qual atualmente é diretor do Conselho Deliberativo. Para Ivo Herzog, o acordo selado com a AGU representa um rompimento de paradigma em relação à forma como os processos judiciais são tratados no país. "O grande ponto de hoje, do que está acontecendo aqui, sob a liderança do ministro, é uma nova AGU, digna, respeitosa, humana, democrática. Uma AGU pertencente ao Estado democrático [com] que meu pai sonhou, pelo qual minha mãe e tantos outros familiares lutaram." Revisão da Lei da Anistia A Lei da Anistia tem sido desvirtuada no Brasil, afirmou o filho de Vlado, mencionando os grupos envolvidos com a trama golpista que tentou impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2023. Para ele, a retomada das discussões sobre esta lei, de 1979, no Supremo Tribunal Federal (STF), é essencial para impedir que fiquem livres de responsabilização agentes que torturaram e assassinaram opositores da ditadura ou que estiveram envolvidos com o desaparecimento destes. Ou seja, a Corte, ao colocar novamente em pauta o assunto, pode diminuir a sensação de impunidade quanto a violências perpetradas no contexto da ditadura. "Tenho duas questões em relação a isso: uma é que não levar esse tema ao plenário e não se decidir é quase como uma forma de tortura para os familiares de desaparecidos, que ficam esperando e vão fomentar mais ou menos a sua esperança em função disso. Não trazer esse tema para o debate também acaba promovendo a distorção do uso do conceito de anistia para grupos que recentemente tentaram abolir o Estado Democrático de Direito", argumentou Ivo Herzog, em apelo ao ministro Dias Toffoli, relator da matéria no STF. Jorge Messias, advogado-geral da União - Marcelo Camargo/Agência Brasil Segundo o advogado-geral da União, Jorge Messias, a reparação à família de Herzog repassa o que há de mais importante, que é o fato de que o povo brasileiro é o principal destinatário das ações da AGU. Segundo ele, a reparação agora firmada é capaz de restaurar a confiança da sociedade no Estado. Messias disse que, durante muito tempo, o cidadão deixasse de confiar no Estado, inclusive por causa de atos de violência física. "O Estado passou a ser uma razão para sua desconfiança." Assassinato de Herzog O jornalista, teatrólogo, filósofo e professor Vladimir Herzog foi assassinado em 25 de outubro de 1975. Vlado trabalhava, na época, na TV Cultura, como diretor de Jornalismo, cargo que assumiu um mês antes de ser morto. Vlado era amante do cinema e, além de ter acumulado passagens por veículos como a TV Excelsior, o jornal Opinião e a rádio BBC de Londres, cidade onde Ivo Herzog nasceu, produziu o documentário em curta-metragem Marimbás e integrou a equipes responsáveis por Subterrâneos do Futebol, de Maurice Capovilla, e Viramundo, de Geraldo Sarno. No dia anterior à sua execução, em 24 de outubro, havia sido procurado por militares na TV Cultura. Vlado colocou-se à disposição e compareceu para depor, no dia seguinte, à sede do DOI-Codi/SP, na Vila Mariana, onde foi torturado e assassinado. Os militares tentaram fazer parecer que a causa de morte do jornalista foi suicídio, de modo que até mesmo a foto que tiraram de Vlado para sustentar sua versão sugeriria que ele havia tirado a própria vida. O registro imagético, porém, provocou justamente a reação contrária, uma vez que mostra a vítima junto a uma janela onde supostamente teria amarrado a corda para se enforcar, em uma posição que não condiz com o que foi alegado. O assassinato de Herzog mobilizou mais de 8 mil pessoas, que foram à Catedral da Sé em protesto, para participar da missa de 7º dia do jornalista. Relacionadas AGU assinará acordo para indenizar família de Vladimir Herzog Comissão reconhece Clarice Herzog como anistiada política Instituto Vladimir Herzog e DPU pedem retomada de renomeação de ruas