Quem passa pelo centro histórico de Mogi das Cruzes deve ter notado que a cor amarelo-terra do Teatro Vasques deu lugar a uma pintura em tom salmão, como parte dos trabalhos de revitalização do imóvel centenário. O diretor do Departamento de Patrimônio e Arquivo Histórico de Mogi das Cruzes, Ubirajara Nunes, explica que a mudança na cor representa um resgate histórico, já que retoma a tonalidade original do teatro, inaugurado em 1902.
O teatro passa por intervenções desde o início do ano, que incluem a implantação de plataformas de acessibilidade e a readequação do sistema de climatização, além da revitalização das fachadas. O resgate da cor orginal, segundo Nunes, foi definida a partir de um processo técnico recente que envolveu prospecção pictórica — um tipo de escavação que identificou a primeira camada de pintura do prédio
No processo de revitalização, segundo o diretor, foram removidas estruturas metálicas instaladas em 2002 nas fachadas laterais para a colocação de condensadoras do sistema de climatização. Com a readequação, os equipamentos foram colocados na área interna das platibandas (parte superior da fachada que esconde o telhado). Para refazer o revestimento com argamassa compatível, houve o desprendimento de partes das molduras das janela, evidenciando a cor original.
“Na hora de fazer todo esse trabalho, partes das molduras das janelas que foram reformadas entre 1935 e 1936 se desprenderam e aí nós identificamos essa tonalidade salmão. Surgiu a necessidade da gente fazer a prospecção pictórica, que é um trabalho técnico de identificação de todas as camadas de pintura que o prédio recebeu”, explicou.
Nunes afirma que não existem documentos que apontem com exatidão a primeira cor. “Nós temos no Arquivo Municipal toda a documentação da época da construção do prédio, que começou em 1901. É curioso porque a gente tinha referência da compra do material para pintura, mas não descrevia a tonalidade”, afirmou. O trabalho identificou seis camadas ao longo da história do teatro. A mais antiga, correspondente ao período da inauguração, apresentava a tonalidade salmão. A cor amarelo havia sido aplicada em 2009.
A prospecção foi realizada em diferentes pontos do edifício, segundo o diretor. “Nós fizemos essa prospecção em ambas as fachadas. Através de relatório técnico, apresentamos esse trabalho ao Comphap (Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Artístico) e, pelo prédio ser tombado, fizemos algumas simulações de cor, que foram devidamente aprovadas pelos conselheiros”, disse. Todo o trabalho no teatro passa pela aprovação de conselhos. Como a caixa cênica do espaço, que inclui palco, camarins e sanitários, foi construída na obra de restauro do final da década de 1970, não foi feita a prospecção nestes locais.
Para o diretor, o resgate da cor reconecta um período pouco presente na memória coletiva: "Trazer a tonalidade do teatro à sua originalidade remete a um período que os mogianos já não recordam. Temos fotos da época, mas são fotos em preto e branco, é um resgate do nosso patrimônio”.
Próximas etapas
O Departamento de Patrimônio prevê nas próximas etapas do trabalho de revitalização a instalação de painéis de madeira do tipo veneziana nos vãos das janelas laterais. Segundo o diretor, as peças estão em processo de aquisição e devem ser feitas sob medida, já que cada vão possui dimensões específicas. A expectativa é concluir essa etapa até fevereiro de 2026. Além da fachada, a plateia também receberá em janeiro pintura do forro em tom preto fosco, com o objetivo de melhorar o foco do espectador no palco.
Durante o processo, o teatro manteve sua programação. “É importante destacar que o Vasques continuou tendo espetáculos e shows, e não ficou fechado", ressaltou Nunes. O investimento na revitalização é de R$ 103.800,00, com recursos da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), que inclui também a pintura da fachada do Arquivo Histórico Historiador Isaac Grinberg.
História
Nunes lembra que o Vasques foi construído como casa de espetáculos, sendo inaugurado em 1902, antes do principal teatro da capital paulista. O nome foi escolhido para homenagear o ator e dramaturgo Francisco Corrêa Vasques. A partir de meados de 1906, o interesse inicial pelo teatro começou a diminuir, e em 1908, a instalação de um cinematógrafo moderno passou a atrair grande público, superando as apresentações teatrais.
Entre 1936 e 1952, o local tornou-se sede da Câmara Municipal. Depois, foi utilizado pela Polícia Militar até a década de 1970, quando passou por um processo de restauração para retomar sua função cultural, sendo reinaugurado como teatro em 1980, na gestão do prefeito Waldemar Costa Filho, numa obra em parceria com o Governo do Estado.
Entre 1980 e 2002, o espaço recebeu o nome de Paschoal Carlos Magno, em referência ao ator e diplomata. O nome original, de acordo com Nunes, foi retomado, em 2002, na gestão do prefeito Junji Abe, tendo como secretário de Cultura, o historiador Prof. Jurandyr Ferraz de Campos. Nesse período, também foram realizadas obras na caixa cênica e instalado o sistema de climatização, com a colocação das estruturas metálicas nas fachadas laterais.
Em fevereiro deste ano, houve a necessidade de readequar o sistema de climatização após o furto de condensadoras. "Nessa situação, já optamos por colocar essas condensadoras na área interna das platibandas. A partir daí, iniciamos o processo de revitalização, a pedido da prefeita Mara Bertaiolli, com a coordenação do Secretário de Cultura Guilherme Dela Plata", destaca o diretor.
Galeria
Foto 1 - Processo de prospecção pictórica e camadas de tinta foi realizado no prédio
Foto 2 - Tom salmão remete a pintura original do teatro