O Café com Mogi News desta terça-feira (13) traz uma entrevista especial com Juraci Almeida, presidente do Conselho Municipal do Idoso (CMI) de Mogi das Cruzes e diretora da Universidade Aberta à Integração (Unai). Ela destaca as atribuições do Conselho, os desafios para a população idosa de Mogi e também o combate à violência contra pessoas idosas. A entrevista foi dividida em dois episódios. Na quinta-feira, dia 15 de junho, que é o Dia Mundial de Conscientização sobre a Violência contra a Pessoa Idosa, acompanhe a segunda parte da entrevista. 

Entre as atribuições do Conselho Municipal do Idoso, Juraci destaca propor políticas públicas, fiscalizar as políticas públicas que já existem e a atenção as necessidades das pessoas idosas. Um dos desafios apontados pela presidente do CMI é em relação à queda nas vagas para instituições de longa permanência para pessoas idosas (ILPI), denominação das casas de repouso. Saiba mais nesta entrevista especial com apoio da Padaria Tita. A gravação foi realizada pela empresa F-Studio - Comunicação Institucional formada pelos publicitários Felipe Claro e Carla Miranda.

Café com Mogi News: Quais são os desafios para as pessoas idosas? 

Juraci Almeida: A gente está em uma época realmente onde a pessoa idosa deixou de ser aquela minoria, já temos uma população inclusive maior do que a de adolescentes de 14 anos. Já estamos na faixa de 15% da população no país. É impossível dizer que não sabe quem é esse sujeito 60+, porque a gente encontra todos os dias, em cada esquina. Quando eu falo de pessoas idosas é a partir dos 60 anos, mas é muito comum hoje você tropeçar mesmo em pessoas acima de 80 anos, que é uma das populações que mais cresce. É o que nos causa até um pouco de surpresa, num país que ainda está em desenvolvimento, que falamos que ainda é um país pobre. Nós temos vários problemas pela frente pela falta de políticas públicas voltadas por esse segmento que está esquecido.

Nós estamos muito atrasados nas políticas públicas. A gente tem um Estatuto do Idoso que já completou 20 anos, mas dentro do seus 118 artigos, nós temos vários que  não foram regulamentados ainda. Como você me apresentou como diretora e coordenadora da Unai, que é a Universidade Aberta à Integração, o objetivo da universidade é esse é integrar mesmo as gerações. E dentro do estatuto, nós temos lá no artigo, não sei se é o 24 ou 25, mas está entre os dois, sobre o apoio às Universidades da Terceira Idade, mas isso não foi regulamentado ainda. Então que apoio é esse? Por isso que nós temos poucas universidades dentro do país, sem falar de um número altíssimo de analfabetos acima de 60 anos, porque não existe a educação continuada para esse público.

Quando eu falo da Unai, não se esqueça que nós estamos dentro de uma instituição de ensino superior particular, então acaba elitizando a educação. Apesar de ser um valor bem social, mas quem não pode pagar, está impossibilitado de participar de uma Universidade da Terceira Idade. Muitos não tiveram nenhuma oportunidade de entrar em uma universidade e, às vezes nem para conhecer, e agora onde tem uma universidade com a proposta de educar para o envelhecimento com qualidade de vida, ele é impedido porque ele não tem como pagar hoje a universidade que custa R$ 180 por mês, que é mais de 10% já do salário mínimo.

Isso é muito injusto para um cidadão que ajudou a construir esse país e não teve oportunidade de ir para escola. Vamos falar desses 26% não tiveram a oportunidade de se alfabetizar e ainda hoje lhe é negado, porque não foi regulamentado um artigo que está em uma lei federal. É só para começar a falar do quanto as políticas públicas estão atrasadas no nosso país em favor dessa população que já envelheceu.

CMN: A lei para ser efetiva precisa estar regulamentada. 

Juraci: Sim, porque senão são letras mortas no papel. Você tem a lei e é muito legal. Uma lei federal é cumpra-se, mas precisa regulamentar. De que forma será esse apoio, será a inserção de imposto às universidades particulares? Precisa ter um deputado federal que realmente abrace a causa da educação, por exemplo, falando não só desse artigo. A população idosa precisa realmente voltar para os bancos mesmo aquele que não é o analfabeto. Tem uma frase que eu gosto muito, no sentido de do quanto ela é verdadeira, mas é muito triste: 'Se você não conhece a pobreza, conhecerá quando você se aposentar'.

CMN: Como é o trabalho do Conselho do Idoso nesse sentido?

Juraci: O Conselho Municipal do Idoso tem como uma de suas atribuições propor políticas públicas, fiscalizar as políticas públicas que já existem e por vezes algumas já estão totalmente obsoletas. Nós temos que ter esse olhar sobre qual é a necessidade desse idoso de hoje e também da minha avó, porque nunca tivemos um encontro tão grande de gerações. Hoje, dentro de uma mesma família, temos uma pessoa de 90 anos, a filha de 70 que também já é uma idosa, o neto com seus 40, e o bisneto com 12. Esse encontro de gerações é uma coisa desse século, porque a longevidade realmente foi um avanço da ciência. Palmas para a ciência que nos deu aí minimamente mais 30 anos de vida, mas nós temos que nos preparar para viver esses 30 anos a mais.

Antigamente a gente envelhecia, e depois de uns cinco anos já morria. Por isso falam que a previdência está falida, sim, porque não foi previsto que as pessoas iriam viver tanto depois de aposentadas. Temos que pensar nisso, e as políticas têm que avançar. O Conselho pensa nisso, cobra as políticas públicas e  tem que ser atuante. A sociedade civil está ali? O poder público está participando? Estamos todos numa mesa, estamos conseguindo ter um diálogo? Porque isso é muito difícil, tem muitos conselhos que estão totalmente subordinados ao poder público. Mas o Conselho é um órgão de controle social e também fiscalização, mas fundamentalmente ele é controle social. Eu estou vinculada a um órgão público, mas subordinada jamais.

Eu vejo conselhos, até porque eu já estive no Conselho do Estado, fui vice-presidente. Quando eu estava no Estado eu tive oportunidade de percorrer as cidades, principalmente da Região Metropolitana e e vi que precisamos avançar muito. A sociedade de uma forma geral não sabe nem que existe Conselho e para que serve. Mogi das Cruzes realmente sempre teve conselhos atuantes. Aí a gente tem que voltar na história e trazer o padre Vicente, que foi uma das pessoas que levantou a bandeira da pessoa idosa dentro do nosso município e foi muito atuante no Estado também, chegou a ser até membro do Conselho Nacional da Pessoa Idosa, foi presidente do Conselho do Estado e eu meio que fui contaminada pelor padre Vicente. Um grande amigo que está com seus 95 anos, já não mais tão atuante, mas deixou sementinhas e um legado muito grande para todos nós, que precisa ter continuidade, e é o que eu venho tentando fazer nesses 22 anos que eu estou na militância em favor da pessoa idosa.

Nós temos cobrado bastante, não importa o partido que esteja no governo, ele tem que ser cobrado sempre. Eu gostaria muito que todos entendessem que quando a gente fala de cobrar, das críticas que um Conselho faz, elas são sempre construtivas, é para ajudar, é apontar o que precisa ser feito para que a população realmente envelheça com qualidade de vida no nosso país e no nosso município.

CMN: Em Mogi das Cruzes, quais são os apontamentos que o Conselho tem feito?

Juraci: As nossas reivindicações não mudam, porque a gente vem batendo na mesma tecla já há muitos anos e pouco avançamos na questão da falta de vagas em ILPIs, que são as Instituições de Longa Permanência para Idosos, que são as casas de repouso. Nós temos poucas vagas, e hoje em Mogi, uma população já ultrapassando 66 mil pessoas acima de 60 anos. Não chegamos a 120 vagas, então houve um retrocesso muito grande, porque por volta de 15 anos atrás, tínhamos em torno de 165 vagas. Eu estou falando que na época eram 39.816 idosos e havia 165 vagas. Hoje eu tenho 66 mil pessoas e em torno de 120 vagas.

A política está muito atrasada realmente e não é avançar só em ILPI. Nós precisamos primeiro da prevenção porque a ILPI é quando já esgotou tudo. A pessoa não teve acesso a todas as políticas e não tem mais condições de viver sem cuidados, então precisa ir para uma casa de repouso. Nós temos que trabalhar a prevenção. A Organização Mundial de Saúde fala que sem atividade física, se você for sedentário, você está condenado a ter que ir para uma casa de repouso particular ou filantrópica.

Vamos olhar para a cidade, vamos pensar que o esporte não é só para os jovens, não é para quem só joga futebol, para quem joga vôlei, para quem nada. Nós precisamos dar atividade física para essa população. Se nós formos em alguns dos bairros da periferia, nem calçada tem para caminhar. As pessoas mais velhas, inclusive, têm medo de sair de casa, tropeçar e cair porque escutou que a amiga foi até a quitanda e acabou tropeçando e caiu. Assim começa o isolamento e junto com o isolamento, vêm as doenças, a depressão, a primeira coisa é a parte emocional, é a parte psicológica.

Nós temos que pensar realmente que a Secretaria de Esporte tem que ser mais amplo à pessoa idosa, que tem que estar inserida dentro desse projeto. Nós temos um Pró-Hiper, uma coisa maravilhosa que já vem de governos anteriores, que precisa ser ampliado e descentralizar. Todas as políticas não podem ser centralizadas, em hipótese alguma, porque praticar atividade física não é luxo, é necessidade. Então senão investir no esporte, na saúde e na atividade física, vai ter que investir na Secretaria de Saúde, e é muito mais caro, porque já vai tratar da doença. Então, seria maravilhoso que as pessoas pudessem envelhecer realmente todas participando, integradas na sociedade, fazendo atividade física, ampliando o seu convívio social, isso é fundamental. Essas são as reivindicações do Conselho Municipal do Idoso.

A pessoa idosa não é Assistência Social, e esse é o quadro que a sociedade tem, porque infelizmente a população brasileira na sua grande maioria é de baixa renda, então é óbvio que ele precisa de uma série de serviços da Assistência Social, serviços diferenciados inclusive, mas não é só. Por que que muitas vezes um idoso tem que ir para uma casa de repouso? Por falta de habitação, onde está a questão da moradia para longevidade? o que temos? Nós temos uma Vila Dignidade, sim, e temos orgulho. Tenho vontade de andar até com a foto no bolso, é um espetáculo. As pessoas olham e falam: 'mas onde é isso, no Brasil? Sim, no Brasil, em Mogi das Cruzes'. E agora está toda reformada, porque o Conselho Municipal teve que brigar, ir até o Ministério Público para conseguir que um patrimônio municipal não fosse totalmente para o chão, como acabou indo a colônia que nós tínhamos antigamente no Jardim Araci que virou pó.

(Continua nesta quinta-feira, dia 15, às 10 horas)