Israel anunciou nesta segunda-feira (28) a entrada de 120 caminhões de ajuda humanitária na Faixa de Gaza, no domingo (27). O governo palestino do Hamas, no entanto, alega que foram apenas 73 e que a maioria foi saqueada. O Cogat, um órgão do Ministério da Defesa israelense, afirmou que a carga transportada pelos 120 caminhões foi “distribuída” no domingo pela Organização das Nações Unidas (ONU) e por organizações humanitárias em Gaza, onde a desnutrição atingiu “níveis alarmantes”, segundo a ONU. “Os alimentos transportados por mais de 120 caminhões foram recebidos e distribuídos ontem (domingo) pela ONU e por organizações internacionais", escreveu na rede social X o Cogat, que supervisiona a entrada de ajuda humanitária em Gaza.  Citado pela agência de notícias EFE, o governo do grupo extremista palestino Hamas informou, no entanto, que apenas 73 caminhões entraram na Faixa de Gaza, "a maioria foi saqueada sob o olhar atento da ocupação israelense e dos seus drones, em uma clara tentativa de impedir que a ajuda chegasse aos centros de distribuição". Segundo o Hamas, foram feitas ainda três operações de lançamento de ajuda aérea que "não representaram mais do que o equivalente a dois caminhões" e cujos mantimentos caíram em regiões consideradas de combate pelo exército israelense e inacessíveis aos civis por questões de segurança. Ontem, Israel declarou uma pausa diária nos combates para fins humanitários em certas regiões do território palestino devastado por quase 22 meses de guerra.  O objetivo do governo de Benjamin Netanyahu é “refutar a alegação falsa de fome deliberada na Faixa de Gaza”. A pausa ocorre durante o dia em Al-Mawasi, Deir al-Balah e na cidade de Gaza das 10h às 20h (horário local) até um novo aviso, informou o Exército de Israeal. Rotas seguras preestabelecidas também estarão em vigor permanentemente das 6h às 23h, acrescentou. Arma de guerra Também nesta segunda-feira, o secretário-geral das Nações Unidas frisou que a “fome nunca deve ser usada como arma de guerra”, em uma referência, em particular, aos conflitos em curso em Gaza e no Sudão. “Os conflitos continuam propagando a fome em Gaza, no Sudão e em outros lugares. A fome alimenta a instabilidade e compromete a paz. Nunca devemos aceitar a fome como arma de guerra”, afirmou Guterres, em uma videoconferência na Cúpula das Nações Unidas sobre Sistemas Alimentares (UNFSS), que ocorre na Etiópia. A Organização Mundial de Saúde já alertou para os "níveis alarmantes" de subnutrição na Faixa de Gaza e que o "bloqueio deliberado" de ajuda humanitária já custou a vida de muitos palestinos. Das 74 mortes relacionadas à desnutrição registradas desde o início do ano, 63 ocorreram neste mês, incluindo 24 crianças com menos de cinco anos, uma criança com mais de cinco anos e 38 adultos, informou a agência da ONU. Dois Estados A sede das Nações Unidas recebe, a partir desta segunda-feira, uma conferência internacional dedicada à questão palestina e organizada com o objetivo de relançar a chamada solução de dois Estados – Palestina e Israel. O encontro de alto nível em Nova York, co-presidido pela França e pela Arábia Saudita, e que termina nesta terça-feira (29), foi inicialmente previsto para ocorrer em junho, mas foi adiado de última hora devido à guerra entre Israel e o Irã. A Assembleia Geral da ONU, composta por 193 membros, decidiu em setembro do ano passado que a conferência seria realizada em 2025. A conferência tem como objetivo definir os parâmetros para um roteiro para um Estado palestino, garantindo a segurança de Israel. O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Noel Barrot, afirmou ao jornal La Tribune Dimanche em entrevista publicada no domingo que aproveitará a conferência para pressionar outros países a se juntarem à França no reconhecimento de um Estado palestino. A França pretende reconhecer um Estado palestino em setembro, na reunião anual de líderes mundiais na Assembleia Geral das Nações Unidas, disse o presidente Emmanuel Macron na semana passada. “Vamos lançar um apelo em Nova York para que outros países se juntem a nós para iniciar uma dinâmica ainda mais ambiciosa e exigente que culminará em 21 de setembro”, afirmou Barrot, acrescentando que esperava que, até lá, os países árabes condenassem os militantes palestinos do Hamas e exigissem o desarmamento do grupo extremista. O conflito começou em 7 de outubro de 2023, quando o Hamas matou 1,2 mil pessoas no sul de Israel e fez cerca de 250 reféns, de acordo com dados israelenses. Desde então, a campanha militar de Israel matou quase 60 mil palestinos, segundo as autoridades de saúde de Gaza. Os EUA não participarão da conferência na ONU, informou um porta-voz do Departamento de Estado que descreveu a reunião como “um presente para o Hamas, que continua rejeitando as propostas de cessar-fogo de Israel que levariam à libertação dos reféns e trariam calma a Gaza”. O porta-voz do Departamento de Estado acrescentou que Washington votou contra a Assembleia Geral no ano passado, que apelava à realização da conferência, e que “não apoiaria ações que comprometessem a perspectiva de uma resolução pacífica e duradoura para o conflito”. O porta-voz internacional da missão de Israel na ONU Jonathan Harounoff, informou que Israel também não participará da conferência que, segundo ele, “não aborda com urgência a questão de condenar o Hamas e devolver todos os reféns que ainda estão com o Hamas”. A ONU há muito tempo apoia a proposta de uma solução em dois Estados vivendo lado a lado dentro com fronteiras seguras e reconhecidas. Os palestinos querem um Estado na Cisjordânia, em Jerusalém Oriental e na Faixa de Gaza, todos territórios conquistados por Israel na guerra de 1967 com os Estados árabes vizinhos. Membro pleno Em maio de 2024, a Assembleia Geral das Nações Unidas apoiou, por esmagadora maioria, a candidatura palestina para membro pleno da ONU, reconhecendo-a como qualificada para aderir e recomendando ao Conselho de Segurança da ONU que “reconsiderasse a questão”. A resolução obteve 143 votos a favor e nove contra. A votação da Assembleia Geral foi uma demonstração global de apoio à tentativa palestina de se tornar membro pleno da ONU – uma medida que reconheceria efetivamente um Estado palestino – depois que os EUA vetaram a proposta no Conselho de Segurança da ONU várias semanas antes. Histórico Há mais de 75 anos, desde a divisão da Palestina entre um Estado judeu e outro árabe, a ONU tem um papel fundamental na história dos palestinos, questão que voltou a ser o centro da conferência internacional que ocorre nesta semana em Nova York. Em 29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral da ONU aprovou a Resolução 181 sobre a divisão da Palestina, então sob mandato britânico, e a criação de dois Estados, um judeu e outro árabe, com Jerusalém tendo um estatuto internacional. Os Estados árabes e os palestinos opuseram-se. O movimento sionista aceitou. Em 14 de maio de 1948, o Estado de Israel foi proclamado. Os exércitos árabes entraram em guerra contra este novo Estado, que obteve uma vitória esmagadora em 1949. Em 1967, a Resolução 242 do Conselho de Segurança estabelece as bases para uma paz justa e duradoura, mas introduz uma ambiguidade entre as diferentes versões linguísticas. Em 13 de novembro de 1974, Yasser Arafat, líder da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), criada dez anos antes, profere seu primeiro discurso na tribuna da ONU, onde aparece com um ramo de oliveira e uma arma. O principal avanço em direção à paz não veio da ONU. Em 1993, Israel e a OLP, que proclamou em 1988 o “Estado palestino independente”, concluíram negociações secretas em Oslo e assinaram em Washington uma declaração de princípios sobre a autonomia palestina. Em 1994, Yasser Arafat regressa aos Territórios Palestinos, após 27 anos de exílio, e estabelece lá a Autoridade Palestiniana. As decisões do Conselho de Segurança sobre a questão palestina dependem em grande parte da posição americana. Desde 1970, os Estados Unidos utilizaram o seu veto cerca de 40 vezes para proteger o seu aliado Israel.  Relacionadas Israel faz "pausa tática" em Gaza para entrada de ajuda humanitária