O debate sobre as inúmeras e profundas contradições da sociedade capitalista é muito antigo. Ele tem pelo menos três séculos. Por mais que o sistema capitalista seja praticamente hegemônico em todo o mundo, as mazelas sociais continuam se reproduzindo de forma ampliada.
No caso do Brasil, esse fenômeno é ainda mais intenso. A renda de 15 mil pessoas pertencentes ao topo da pirâmide social cresceu, nos últimos anos, até o triplo do ritmo observado entre o restante da população, elevando a concentração da riqueza. Entre essa elite, que representa 0,01% da população, o crescimento médio da renda praticamente dobrou (96%) entre 2017 e 2022. Enquanto isso, os ganhos da imensa maioria da população adulta (os 95% mais pobres) não avançaram mais do que 33%.
Hoje, o governo federal busca construir uma medida que é direcionada para os cerca de 250 mil brasileiros com renda anual de ao menos R$ 1 milhão, segundo dados da Receita Federal. O motivo é simples: eles pagam, na pessoa física, muito menos tributos do que poderiam. Proporcionalmente, um CLT pode arcar com quase oito vezes mais que um desses milionários, por exemplo.
O que se discute no âmbito do Ministério da Fazenda, é criar um imposto mínimo de 10% sobre os rendimentos desse seletíssimo clube, que sequer representa 0,01% dos 102 milhões de brasileiros com alguma ocupação, de acordo com o IBGE.
No atual cenário, um típico trabalhador de carteira assinada, de cada R$ 10 ganhos como salário, até R$ 4 podem ser descontados em pagamentos de imposto de renda e contribuição previdenciária. Ou seja, um empregado CLT pode recolher até oito vezes mais em tributos do que um dos 250 mil milionários do país.
Isso acontece por diversos motivos. O mais polêmico deles é a isenção de imposto de renda para os chamados "lucros e dividendos". Desde 1995, esses recursos são livres de tributação, o que coloca o Brasil na contramão dos países mais desenvolvidos do mundo.
Mais ainda. O governo quer isentar de pagamento de imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil. E entre R$ 5 mil e R$ 7,5 mil, uma taxa escalonada que também reduz o valor que é pago hoje em dia. Significa aumentar o poder aquisitivo dessa expressiva parcela da população. E isso faz bem para a economia, pois aumenta o consumo.
E o Congresso Nacional, que supostamente é a casa do povo, não tem olhos e nem ouvidos para perceber como isso é importante e benéfico para esse segmento social. Eles se colocam contra taxar as grandes fortunas, pois boa parte dos deputados e senadores fazem parte ou tem suas campanhas bancadas por essa minoria que tanto concentra a renda e riqueza produzida pelo trabalho.
Seria uma boa hora pra se promover a justiça tributária e social no nosso país.
Afonso Pola (acelsopp@gmail.com) é sociólogo e professor