No Brasil, a esperança definha a passos largos, mesmo sendo ela conhecida como a última a morrer. Tal característica da esperança está ligada ao mito de Pandora. Para quem não conhece, Pandora é um mito grego que narra a chegada da primeira mulher à Terra e com ela a origem de todas as tragédias humanas. 

Depois de criar Pandora, a primeira mulher, Zeus, o chefe dos deuses do Olimpo, ao enviá-la à terra entregou-lhe uma caixa, recomendando que ela jamais fosse aberta pois dentro dela os deuses haviam colocado um arsenal de desgraças para o homem, como a discórdia, a guerra e todas as doenças do corpo e da mente, além de um único dom: a esperança. Vencida pela curiosidade, Pandora acabou abrindo a caixa e acabou liberando todos os males no mundo, mas a fechou antes que a esperança pudesse sair. 

Pois bem. A esperança de um país está intimamente ligada ao futuro de suas crianças. Se as crianças encontram um ambiente propício ao seu desenvolvimento, o país se desenvolve junto com elas.

Mas não é isso que presenciamos historicamente no Brasil. Temos imensas dívidas sociais que nos caracterizam desde o processo de colonização e, em períodos como o que vivíamos até a pouco, essas dívidas se aprofundaram. Além de um governo inoperante no que se refere ao desenvolvimento de políticas publicas efetivas para a população mais vulnerável, tivemos também uma pandemia que impactou muito a vida das pessoas, principalmente das crianças e jovens.

Foram muitas as privações que impactaram crianças e jovens nesse referido momento. Entre elas estão a falta de acesso a saneamento básico (alcançando 21,2 milhões de meninas e meninos), seguida pela privação de renda (20,6 milhões) e de acesso à informação (6,2 milhões). A elas se somam a falta de moradia adequada (4,6 milhões), privação de educação (4,3 milhões), falta de acesso a água (3,4 milhões) e trabalho infantil (2,1 milhões). No total, são 32 milhões crianças e adolescentes afetados por uma ou mais de uma dimensão da pobreza multidimensional. Esses são dados divulgados pelo UNICEF, uma instituição cria pela ONU em 1946.

Boa parte das crianças em situação de pobreza depende das escolas que frequentam para se alimentarem. Para essas crianças e suas famílias, o período de férias escolares é terrível, pois elas perdem tal possibilidade.

São inúmeras as pesquisas acadêmicas que indicam que o acúmulo de deficiências nutricionais, seja causado pela fome, seja pelo consumo de alimentos de baixa qualidade, pode causar impacto na habilidade de aprendizado infantil.

Com esse quadro e as dificuldades para revertê-lo, onde encontrar a tal “esperança”?

 

Afonso Pola (afonsopola@uol.com.br) é sociólogo e professor