Na caverna escura da Ignorância, onde a Luz nunca entrara, vivia um aprendiz muito simples que implorava o socorro divino do esclarecimento. Declarava-se o mais infeliz dos homens, não obstante, em sua cegueira moral, sentia-se o melhor de todos. Reclamava do ambiente fétido em que se encontrava. O ar pestilento o sufocava. Sem muita certeza pedia ao Todo uma porta libertadora que o conduzisse ao convívio da plena claridade. Afirmava-se robusto, apto, capaz. Por que motivo era conservado ali, naquele isolamento doloroso, numa atmosfera tão insuportável?

Suas súplicas, entre revolta e amargura, foram percebidas pelo Todo que, profundamente compadecido, lhe enviou a fé. A sublime virtude exortou-o a confiar no futuro e a persistir na oração. O infeliz consolou-se, mas sem tomar nenhuma iniciativa, logo em seguida, voltou a se lamuriar. Queria fugir, desistir, abandonar a vida, e como suas lágrimas aumentavam, o Divino mandou-lhe a esperança.

A emissária divina lhe afagou a fronte e lhe falou da vantagem do esclarecimento, da perenidade da Vida, buscando lhe secar o pranto desesperado. Rogou-lhe calma, resignação e fortaleza. O pobre aprendiz pareceu melhorar, mas decorrido algum tempo, dentro de toda passividade, voltou às lamentações. Comovido, o Dono da Vida fez com que a caridade o procurasse. A nova mensageira acariciou-o e alimentou-o. Dirigiu-lhe palavras de carinho. Amparou-o, como se fosse abnegada mãe. Todavia, o aprendiz persistia gritando, revoltado.

Foi então que o Grande Arquiteto lhe enviou a verdade. O portador do esclarecimento agora se fez uma grande luz, o infortunado, pela primeira vez na vida, viu-se tal qual era e apavorou-se, ao ver seu corpo estava coberto de chagas. Somente agora, percebia, espantado, que ele mesmo era o responsável pela atmosfera intolerável em que vivia. Sem coragem para encarar a visitante que lhe abria as portas da libertação, fugiu em busca de outra furna onde conseguisse esconder a própria miséria. 


Raul Rodrigues é mestre em Engenharia e ex-professor universitário.