No Café com Mogi News desta terça (15), um dos episódios é com o médico veterinário Jefferson Leite, proprietário da clínica Zoomédica e funcionário do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) de Mogi das Cruzes. Ele explica um pouco sobre o perigo que os animais silvestres podem levar à saúde humana, mesmo que pareça inofensivo, como um bicho-preguiça. Além disso, o profissional também destacou na entrevista os cuidados que devem ser tomados com o animal e o que deve ser feito em cada situação. Saiba mais nesta entrevista especial, com apoio da Padaria Tita.
Café com Mogi News: Como o senhor começou a gostar de animais e como começou de fato na profissão de médico veterinário?
Dr. Jefferson Leite: Eu sempre gostei de bicho, desde moleque. Meu pai tinha sítio, vivia no sítio antes de ir pra faculdade. Eu fiz curso técnico em Agropecuária e eu me aventurei na faculdade de Medicina Veterinária. Me formei na Universidade de Alfenas, em Minas Gerais, saí de lá em 1994. Faz um tempinho que a gente está na briga da profissão. Em 1994, eu abri uma clínica e desde então a gente já atendia animais silvestres. Inclusive tem uma matéria do primeiro animal silvestre que eu atendi, em 94, que é um veado-catingueiro filhote que a gente recebeu na clínica. Naquele tempo não tinha para onde encaminhar, era meio complicado para conseguir contato com o zoológico.
CMN: Hoje em dia como funciona o atendimento para animais silvestres?
Dr. Jefferson: O número de atendimentos de animais silvestres cresceu muito nesses anos. Tinha poucas ocorrências, muitas vezes os Bombeiros que resolviam essas questões, que recolhiam e também não tinham o que fazer, encaminhar para algum órgão, algum zoológico. Ao longo do tempo esses números cresceram muito, porque a cidade cresce e as ocorrências também. Hoje, a Prefeitura (de Mogi das Cruzes) tem convênio com a Associação Mata Ciliar, de Jundiaí, que é um centro de reabilitação de animais silvestres, e todos que são recolhidos pela Prefeitura e precisam de atendimento, tratamento e um cuidado melhor, são encaminhados para Jundiaí.
CMN: Quando uma pessoa encontrar um animal silvestre na rua, o que ela deve fazer?
Dr. Jefferson: Hoje, a gente orienta à população a entrar em contato com o setor de Zoonoses, porque muitas vezes esses animais não demandam uma remoção propriamente dita, mas às vezes uma orientação. A gente teve um caso de uma pessoa falando de um urubu que estava no telhado da loja dela. Era um filhote de urubu que estava saindo do ninho, mas não demandava interferência nossa para resgatar aquele animal que estava exercendo sua natureza, está aprendendo a voar, recebendo alimentação dos pais, então muitas vezes só uma orientação resolve. O que a gente sempre orienta as pessoas é: não tentar fazer a manipulação, não tentar pegar, capturar, principalmente sem conhecimento. Uma simples ave, por exemplo um urubu, que é um bicho que parece ser uma ave fácil de conter, ele pode agredir e vai se defender, óbvio, e pode ser perigoso. Ele tem uma força no bico que pode causar lesões mais graves. A gente falou das preguiças, o pessoal acha que a preguiça é um bicho tranquilo, mas ela oferece um risco e pode machucar alguém. A gente orienta: se vir um bicho atravessando a pista, não tente manipular, não tente pegar, porque ela vai se defender, ela não sabe que você está querendo ajudar, ela vai tratar aquilo como um predador, vai tentar se defender e nessas horas pode acontecer um acidente mais grave.
CMN: Há um tempo o senhor salvou uma preguiça de fios de alta tensão e, um pouco antes de começarmos, o senhor comentou que teve um outro caso. O senhor pode falar mais pra gente?
Dr. Jefferson: No primeiro caso, na verdade, foram duas preguiças no mesmo dia. Esses casos de fios de alta tensão acontecem com muita frequência. Infelizmente esses animais acabam acessando a rede de alta tensão e sendo eletrocutados. Nesse caso específico que você tava falando das preguiças, foram duas no mesmo lugar, uma estava numa antena de TV de uma casa e na frente tinha um outro animal que estava subindo no poste. Infelizmente, esse a gente não conseguiu resgatar porque acessou a rede elétrica.
A gente acionou a companhia de energia para poder fazer a remoção com segurança, porque há um risco de choque elétrico e infelizmente esse animal acabou vindo a óbito porque tocou a rede de alta tensão. Mas isso é importante: as pessoas às vezes querem ajudar e não se deve. No dia que a gente chegou lá, tinha um pessoal que queria colocar uma escada na rede elétrica e resgatar o animal. Falei: ‘Não, deixa o animal, por enquanto a gente só vai observar’. Acionamos a companhia elétrica para poder ir até o local e fazer a remoção. Então é importante não tentar acessar a rede elétrica, tem que ter cautela.
CMN: Outro fato recente foi um menino que faleceu depois de ser picado por uma cobra. O que as pessoas devem fazer quando veem um animal desse, qual o procedimento que elas podem tomar? Porque, como você falou, o urubu pode picar, a preguiça pode arranhar e a cobra também tem seus perigos.
Dr. Jefferson: Essa foi uma fatalidade, um acidente com uma serpente cascavel que tem uma peçonha que causa um envenenamento bastante grave. Nessa época do ano a gente tem um aumento dos casos de acidentes assim, por conta do calor, você tem uma maior atividade desses animais. Para evitar o acidente, é bom sempre olhar, usar equipamentos. Se você vai trabalhar em uma área de mato, num terreno, materiais que estão parados, sempre usar proteção, porque há um risco de acidente, não só com serpente, mas com aranha e outros animais peçonhentos. O pessoal liga muito no CCZ, nessa época do ano é constante encontrar serpentes dentro de casa e a orientação é: ligue para o CCZ. A gente faz a remoção com segurança desse animal. O máximo que a gente pede é, para o bicho não sair ou se esconder, colocar um balde em cima, mas não chegar perto, e deixar esse bicho contido ali dentro do balde. Não tentar pegar ou manipular, mesmo que você ache que não seja peçonhento.
A gente teve problemas dentro do CCZ de um funcionário manipulando uma coral, que para ele era falsa, e quando eu vi era uma coral verdadeira. Faltou um pouco de cuidado na hora de identificar e isso poderia ter causado um acidente seríssimo, levando até a óbito. As corais são muito tranquilas, elas não picam, só mordem, então você pode estar manuseando e ela pode morder, aí o problema está feito. Uma toxina bastante grave que pode levar a óbito o acidentado. Então cuidado com esse negócio de coral falsa, verdadeira, querer saber o que é falsa e verdadeira, deixa isso com um profissional.
A gente recolhe e já orienta se é verdadeira e falsa, até porque a gente vê esses bichos circulando e eles estão só circulando de forma comum. Às vezes a gente orienta uma modificação ambiental, porque é isso que está atraindo esses animais para dentro de casa. Um lixo mal posicionado que atrai roedores, que atraem serpentes. Ou uma lâmpada que está atraindo insetos, que atraem sapos, que atraem as serpentes e vira uma bola de neve. Às vezes só uma modificação ambiental e você diminui a incidência de serpentes. Em áreas rurais é bem comum a gente encontrar esses animais dentro de casa, em lugares mais quentes, como se fosse uma proteção, e um acidente acontece nesses casos.
CMN: Nos últimos tempos a gente também vem tendo muitos casos de doenças como a varíola dos macacos e a febre amarela. O senhor comentou que o pessoal matava os macacos achando que eles eram os transmissores.
Dr. Jefferson: Pois é. São duas coisas diferentes: a varíola dos macacos é um vírus que atinge os seres humanos, tem esse nome de forma errônea, porque os primeiros casos relatados foram em macacos de laboratório e ficou o nome de varíola de macacos, mas não tem o macaco como transmissor. Foi um nome que não é o correto, a transmissão é homem a homem, então não tem nada a ver com a transmissão animal. Matar esses bichos não adianta em nada.
A questão da febre amarela, a gente teve mais casos de problemas envolvendo primatas nessa época. As pessoas realmente jogavam pedra. Durante esse tempo a gente teve que necropsiar todos os casos envolvendo primatas. A gente pegou muito bicho que foi morto por tiro, pedrada, e é um absurdo. Tudo é uma informação errada. O primata, no caso da febre amarela, é um sinalizador da doença, porque a doença ocorre normalmente no meio silvestre e os primeiros a ficarem doentes são os macacos, então quando a gente tinha caso de macaco positivo, é um indicativo de que o vírus está circulando ali. Se você mata o seu sinalizador, você só ia perceber o problema quando começasse a morrer gente naquele local. Então isso era um risco, matar o macaco, aquele que sinaliza para você a existência do vírus ali e, se você não tem como impedir, você consegue prevenir, sabendo que morreu macacos.
CMN: E como o pessoal encontra o senhor nas redes sociais?
Dr. Jefferson: Eu tenho um consultório veterinário, que atende principalmente animais da fauna silvestre, exóticos, os pets não convencionais. Os animais que fogem de cão e gato. Hoje o foco é nesses animais. Chama Zoomédica, está no Instagram @zoomedica e a gente trabalha nessa área há um bom tempo, pegando um segmento não muito comum.
*Texto supervisionado pelo editor.