A elevação da temperatura dos oceanos, que ocorreu entre 2023 e 2024, levou à criação de uma onda de branqueamento de corais em todo o mundo. Estima-se que 84% dos recifes coralinos do planeta tenham sido afetados pelo fenômeno, que consiste na interrupção da simbiose de algas fotossintetizantes (zooxantelas) com os corais. Ao perder o contato com as zooxantelas, os corais perdem uma fonte importante de nutrição e ficam mais fracos, tornando-se assim sujeitos a doenças e à morte. O Brasil não saiu ileso da onda global que causou a mortandade de corais, principalmente das espécies coral-de-fogo (Millepora alcicornis) e o coral-vela (Mussismilia harttii), entre os litorais de Maragogi (AL) e Natal. Banco de corais de cadeia submersa do Norte do Brasil mostram branqueamento. - Cabeço Branco - UFPE A praia de Porto de Galinhas, no litoral pernambucano, conhecida por seus passeios de jangada até recifes de coral, foi um dos trechos do litoral que sofreu com a onda de branqueamento. É lá que funciona o projeto Biofábrica de Corais, que alia ecoturismo com a regeneração dos recifes pernambucanos. “A colônia de corais de Porto de Galinhas teve perdas maiores que 95%. Tudo que sobreviveu foram pequenos fragmentos com tamanhos de menos de um ou dois centímetros”, explica o engenheiro de pesca Rudã Fernandes, gestor da Biofábrica de Corais. A biofábrica mantém uma área destinada à pesquisa e à visitação pública em Porto de Galinhas, onde realiza seus trabalhos de recuperação de fragmentos de corais, reprodução desses organismos e restauração do recife. Parte do trabalho de reprodução e crescimento desses animais, do grupo dos cnidários (o mesmo das águas-vivas), é feito diretamente no recife, onde os bebês-corais crescem na natureza. Outra parte é feita fora dali, em tanques de um laboratório localizado no Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Nordeste (Cepene), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em Tamandaré, também em Pernambuco. Os indivíduos cultivados ali, são depois transportados para o recife com um tamanho maior. Foi graças a esse trabalho, que a Biofábrica de Corais conseguiu salvar uma porção relevante dos corais de Porto de Galinhas. “Nossos corais pequenos, cultivados in situ [no próprio recife], que estavam na fase de berçário, infelizmente foram perdidos. Nossas colônias mais velhas conseguiram passar pelo branqueamento. Elas tiveram diminuição da sua área, mas ainda conseguimos salvar 20% delas”, afirma Fernandes. “Então os corais que estão vivos no Porto [de Galinhas] são majoritariamente os manejados pela Biofábrica.” Na orla de Boa Viagem, corais funcionam como barreira natural. As formações rochosas absorvem até 96% do impacto das ondas - Fernando Frazão/Agência Brasil Agora o trabalho envolve fazer o manejo desses corais, a fim de repovoar os recifes de Porto de Galinhas. Em Tamandaré, onde a Biofábrica tem seu laboratório, os corais recolocados no mar também branquearam, mas puderam ser salvos depois de serem transportados de volta aos tanques do Cepene. Neste ano, a Biofábrica de Corais foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), como um projeto global de referência da Década do Oceano. “O endosso representa um respaldo ao que fazemos e é também importante para nos conectarmos com outros pesquisadores e agentes globais importantes nas questões relacionadas à conservação dos oceanos. Isso permite obtenção de conhecimento, parcerias estratégicas, trocas que direcionam nosso trabalho para ser melhor”, conclui Fernandes. Relacionadas Governo leiloa concessão de manejo florestal na B3 pela primeira vez Trópicos registram perda recorde de floresta primária Cerrado: preservação e negócios são tema do Caminhos da Reportagem